Livro: Ainda estou aqui, foto 1

Ainda estou aqui: Marcelo Rubens Paiva resgata história de sua família

De em janeiro 29, 2016

Livro: Ainda estou aqui, foto 1

Marcelo Rubens Paiva e seu filho, que herdou os cabelos loiros e os olhos azuis do avô Rubens Paiva

                                                                                                                                                                    Planet Earth is blue, and there’s nothing I can do/Davie Bowie.

Marcelo Rubens Paiva abre seu livro mais recente, Ainda estou aqui, citando Bowie meses antes de sua morte. E não há mesmo nada que se possa fazer, tanto com a perda do artista britânico como para as condições em que Marcelo se encontra diante da mãe, hoje vítima de Alzheimer e com poucos momentos de lucidez. Justamente uma mulher que, diante da morte brutal do marido e vendo-se só com filhos menores, voltou a estudar, tornou-se advogada combativa e defensora dos direitos humanos.
Num relato emocionado, Marcelo traça um perfil de Maria Eunice Paiva, “a verdadeira heroína da família, sobre ela que nós, escritores, deveríamos escrever”. Num linguagem coloquial, na primeira pessoa e de forma solta e não cronológica, Marcelo fala de memória, da infância, dos momentos em família e conta como a mãe reagiu diante do desaparecimento do pai, o ex-deputado Rubens Beyrodt Paiva, preso, torturado e morto nas dependências dos órgãos repressores da ditadura militar.

Livro: Ainda estou aqui, foto 2

Capa do livro lançado no final de 2015 pela Alfaguara

O livro, lançado pela Alfaguara, é dividido em três partes, mas isto não significa que haja uma  cronologia nos relatos. O autor fala de sua infância, mas também relata logo no início o estado atual da mãe, que se encontra em estágio adiantado da doença — descreve todos os estágios e evolução do mal de Alzheimer —, assim como do nascimento do filho em 2014, de suas férias na fazenda dos avós quando pequeno, da adolescência no Rio de Janeiro e a luta da mãe para provar a verdade sobre o assassinato do marido.
É justamente para falar do desconforto que sente com a falta de memória e a desconexão com o mundo de Eunice, que Marcelo faz um grande retrato da história de sua família. Pela primeira vez os detalhes do caso Rubens Paiva são revelados: o escritor/filho descreve desde o dia em que membros da aeronáutica invadiram sua casa (com metralhadoras) e levaram o pai, os dias de prisão da mãe e da irmã mais velha, a montagem da farsa oficial que dizia que Rubens havia fugido, até os depoimentos de pessoas que estiveram presas na mesma época que o ex-deputado e a reconstituição da verdade, por meio da transcrição do processo do Ministério Público Federal de 2014 em que se tem ciência dos fatos e dos culpados pelo assassinato tão brutal e desumano.
A história do pai serve como fio condutor para que Marcelo revele a força e o exemplo de Eunice, que precisou se reinventar várias vezes na vida. Mais do que mostrar a trajetória de luta da mãe, Marcelo traça um perfil psicológico dela, com o jeito pouco distante de criar os filhos, mas sempre apontando como se portar diante das dificuldades. Se a mãe se mostra pragmática e incisiva, o filho também reconhece a sua presença quando mais precisou dela — logo após o acidente que o deixou “paralisado do pescoço para baixo. Ela ficou do meu lado”. E é nestes relatos pessoais sobre sua relação com a mãe, que Marcelo emociona, mas sem qualquer melodrama.

 

No entanto, enquanto seu raciocínio está confuso, ela pega a minha mão esquerda, mais fechada que a direita, e abre com carinho, dedo a dedo, para alongá-los. Como faz há trinta e cinco anos, desde os primeiros dias em que me viu na UTI paralisado. …Um instinto materno poderoso atravessa o choque e o caos em que vive, e ela faz aquilo que rotineiramente foi parte da vida, cuida do filho.

 

Livro: Ainda estou aqui, foto 3

Eunice Paiva com seus cinco filhos menores

De forma direta, com frases curtas e de forma caleidoscópica, Marcelo Rubens Paiva em Ainda estou aqui  envolve o leitor desde a primeira linha. Particularmente me identifiquei muito com o livro: nasci no mesmo ano que Marcelo, fiquei órfão de pai também muito novo, tenho cinco irmãos e meu pai foi engenheiro civil formado no Mackenzie dois ou três anos antes de Rubens Paiva. A luta para criar os filhos — voltar a estudar, buscar uma profissão e encarar o mercado de trabalho numa época que poucas mulheres trabalhavam —  eu conheço muito bem, o exemplo vem de casa! Como Eunice, há muitas Clarices, Lias, Lourdes, Marias, Eulálias e Teresas! Leitura obrigatória, um livro encantador, lapidar.

 

Fotos: divulgação

 


4 Comentários

aline

fevereiro 5, 2016 @ 18:01

Resposta

Mau, adorei a resenha. Louca pra ler o livro.
bj

Maurício Mellone

fevereiro 8, 2016 @ 14:30

Resposta

Aline,
q bom q vc gostou da resenha, fiquei muito tocado
com o tom q o Marcelo deu à sua visão sobre os
problemas enfrentados por sua família.
Depois q vc ler (passe qdo puder), vou querer
saber sua opinião>
bjs

Dinah

fevereiro 1, 2016 @ 17:32

Resposta

Maurício,
Muito boa a resenha que vc fez para o novo livro do Marcelo Rubens Paiva!
Dá vontade de saber mais, de espiar esse ‘caleidoscópio’ que vc cita como a forma que ele escreveu o livro.

um abraço,
Dinah

Maurício Mellone

fevereiro 2, 2016 @ 12:32

Resposta

Dinah,
tenho certeza q vc irá gostar muito do livro
do Marcelo ( a linguagem dele envolve o leitor)
Depois de ler, volte aqui para dar sua opinião sobre a
obra.
Bjs e obrigado por sua presença sempre constante por aqui!

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