Shame: visão amarga da relação sexo e amor no século XXI

De em março 29, 2012

Michael Fassbender vive Brandon Sullivan, viciado em sexo

Não poderia ter melhor locação para Shame, filme do britânico Steve McQueen, do que Nova York, símbolo máximo do mundo cosmopolita do século XXI. Brandon Sullivan, interpretado por Michael Fassbender, também poderia viver em qualquer outro grande centro urbano, como Berlim, Londres e São Paulo, mas o personagem é perfeito na pele do executivo bem-sucedido de Manhattan, que consegue manter sua privacidade — isola sua vida íntima da profissional—, mesmo sendo um homem viciado em sexo, que a psiquiatria define como dependência sexual.
Desde a primeira cena, fica explícita a compulsão sexual de Brandon: ele é insaciável e pratica sexo a todo o instante, seja com garotas de programa, virtualmente com striper de sites on line, masturbando-se ou em lugares públicos e boates gays. Morando num edifício com uma visão panorâmica da cidade, a rotina de Brandon só é quebrada com a chegada de Sissy (Carey Mulligan), sua irmã, que chega sem avisar. Mais do que ter de dividir o espaço com a irmã, na convivência ele tem de enfrentar talvez sua maior limitação: lidar com seus sentimentos mais profundos e o amor. Esta dificuldade do personagem fica explícita em algumas cenas: quando sai com uma colega do escritório para jantar e, questionado, ele admite que quatro meses foi seu recorde de duração de uma relação amorosa. Dias depois eles vão para a cama e, para surpresa geral, ele brocha. A relação com a irmã, em diversas passagens, revela também a dificuldade de Brandon em relacionar-se afetivamente com o outro.

Os irmãos Sissy (Carey Mulligan) e Brandon, num raro momento afetivo

O próprio título do filme, vergonha, retrata o estado de espírito permanente do personagem: parece que saciado momentaneamente, Brandon sente vergonha do sexo que acabara de praticar. Num artigo publicado no último dia 22 na Ilustrada/ Folha de S.Paulo, o psicanalista Contardo Calligaris diz que mais que se preocupar com as fantasias e as práticas sexuais do dependente, a psiquiatria deve se ater às vergonhas e culpas deste paciente. E completa: “Diante de um paciente (dependente sexual), só poderia, se ele quisesse, tentar disciplinar a culpa e a vergonha que azucrinam sua vida e estragam seus prazeres”.
Muitos espectadores se identificam de imediato com Brandon, não só por sua agitada e compulsiva vida sexual, mas pelo tipo de relação social que se vive hoje em dia nas grandes metrópoles. Sexo é fácil de fazer, como num piscar de olhos. Já amar e manter vínculos afetivos com o outro parece cada vez mais inatingível. Quando se está diante de alguém interessante, que há chance de um investimento maior, ambos recuam com medo de amar, com medo de seus próprios sentimentos. Pércicles Cavalcanti sintetiza este padrão de comportamento atual na canção Medo de Amar, que Adriana Calcanhotto interpreta divinamente.

 

Fotos: divulgação


4 Comentários

Samla

julho 10, 2016 @ 01:27

Resposta

Acredito que o personagem sofreu algo muito deprimente em sua infância, juntamente com sua irmã, pois ambos expressam isso na sua vida adulta com problemas psicológicos, essa insaciedade, vício e vergonha pelo sexo, e a irmã com seus surtos de mutilação e tentativa de suicídio.

Mesmo não sendo explicito, é bem perceptível ao longo do filme esse drama antigo, no restaurante quando Sissy canta e ele chora, e alguns diálogos entre os dois irmão,e até mesmo a aversão pelo casamento (sugerindo uma opinião formada pelo casamento de seus pais talvez).Essa é minha visão, é mais um drama do personagem do que a relação do sexo no século XXI,creio eu.

Maurício Mellone

julho 11, 2016 @ 11:25

Resposta

Samla,
td bem? Muito obrigado por sua visita ao Favo.
Confesso q faz tempo q assisti e redigi a resenha…
Não me lembro de todos os detalhes, como vc deixa claro no
seu comentário.
Vou esperar nova visita e seu comentário sobre uma produção
mais recente.
Desculpe-me

abr

Dinah Sales de Oliveira

março 29, 2012 @ 18:46

Resposta

Maurício,
Não vi o filme, parece que vale a pena ser visto, mas achei bem interessante tbém os links que vc fez, com o artigo da Folha e a música cantada pela Calcanhoto.
Vou conferir tudo junto, se possível.

beijo,
Dinah

Maurício Mellone

março 30, 2012 @ 15:22

Resposta

Dinah,
Obrigado pelo elogio sobre os links
q fiz na resenha do filme Shame.
Acredito que vc deverá sair do cinema
com muito questionamento, o espectador não
sai imune da sala de exibição…
bjs e obrigado pela visita

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