“Precisamos ler, precisamos ler, precisamos ler…”

De em julho 21, 2011

Uma das tendas da 9ª Flip, ocorrida no início de julho em Paraty

Com a reformulação visual do Favo do Mellone depois de completado um ano no ar, as novidades de conteúdo também começam a ser introduzidas. Teremos agora a participação de outros profissionais, que trarão outras vozes e outras visões para esse espaço de ideias e discussões. Dessa vez, meu amigo e jornalista Zedu Lima participou da 9ª Flip (Festa Literária Internacional de Paraty) e nos brinda com esse texto em que faz um resumo do evento ocorrido no início do mês na cidade fluminense. Aproveitem e, Zedu, novamente muito obrigado pela sua valiosa contribuição!

Este alerta do escritor caribenho Caryl Phillips, um dos participantes da 9ª  Flip, deveria ser o objetivo principal de todas as feiras, festas e mostras literárias. Ou seja, que o público presente a elas não se interessem apenas em conhecer os escritores, como se fossem pop stars, mas que suas palestras incentivem a ler. E a julgar pelo grande número de pessoas interessadas no que autores participantes da 9ª Festa Literária Internacional de Paraty tinham a dizer, e principalmente em comprar seus livros ao final de cada palestra, o evento atingiu seu objetivo. Homenageando o escritor paulista Oswald de Andrade, criador do movimento antropofágico na cultura brasileira, a 9ª Flip foi realizada de 06 a 10 de julho. Se seu enredo deixou de fora as polêmicas político-literárias das anteriores, foi pródiga em oferecer páginas de emoção e de desmistificações. 
Do alto de seus 92 anos, o crítico Antonio Cândido deu uma aula de humildade, bom humor e coerência na conferência de abertura – Oswald de Andrade: devoração e mobilidade, que dividiu com o professor de literatura José Miguel Wisnik -, além de exibir uma impressionante memória ao se lembrar de datas e nomes. Amigo que foi de Oswald de Andrade, preferiu falar mais sobre o homem do que sobre a obra dele, que ficou ofuscada pela sua própria biografia. Agitador de ideias, polêmico, sempre inconformado e avesso às críticas, Oswald sempre apareceu mais do que sua obra. Segundo Cândido, ele continha o fermento do anarquismo, “mas soube usar a arma do riso, à qual ninguém resiste, e com isso comprovou que a literatura séria, alta, não é incompatível com a alegria.”
Na mesma noite, a cantora Elza Soares protagonizou outro momento de pura emoção. Carregada até o palco, onde se apresentou sentada numa cadeira de rodinhas devido a uma cirurgia que fez na coluna, Elza foi a escolha certa para o show de abertura, ao lado de José Miguel Wisnik e Celso Sim. Ninguém mais antropofágica do que ela, que há anos vem deglutindo as revezes que a vida lhe prega e devolvendo com arte. O mesmo faz com a música. Basta lembrar como ela deglutiu o jazzístico “In de mood”, de Glenn Miller, e o devolveu como o samba “Edmundo” (Edmundo nunca sabe bem o que faz / ele é um sujeito distraído demais).
As desmistificações começaram com o português nascido em Angola, walter hugo mãe, que se tornou merecidamente o xodó da 9ª Flip. A começar pela grafia do seu nome em minúsculo “para ficar mais próximo do leitor”, está longe do estereótipo do escritor encastelado na sua torre de marfim.  Com muitas tiradas divertidas e de auto-ironia, conquistou logo a plateia, que chegou às lágrimas com um texto que ele leu sobre sua relação com o Brasil.
Como um tio bonachão e cheio de ‘causos’ para contar, João Ubaldo Ribeiro fez a festa do público. Muito bem humorado, não teve a menor preocupação em se revelar por inteiro, quebrando tabus que se criam em torno de celebridades literárias. Ao falar sobre seu maior sucesso, Viva o povo brasileiro, revelou que sua origem foi provar ao seu editor que conseguia escrever um livro grosso, grande e bem escrito. Em outro momento, não teve pejo em confessar: “Vou até dizer algo que nunca disse tão abertamente assim. Guimarães Rosa não está entre os autores de minha predileção. Não que eu o ache desimportante, mas ele não me fala, o santo dele não bate com o meu”.
Momentos como esse justificaram plenamente minha presença na 9ª Flip, que reuniu 33 participantes, sendo 18 estrangeiros e 15 brasileiros. No próximo ano, o homenageado será nosso poeta maior Carlos Drumond de Andrade. Enquanto ela não chega, vamos continuar ouvindo os ecos desta:
– Oswald de Andrade tinha o claro riso dos modernos – Antonio Cândido
– Tem algo de vampiro no escritor, que se apropria de detalhes e sentimentos dos outros (Andrés Neuman, escritor argentino, autor de O viajante do século)
– Os livros nunca são autobiográficos na partida, mas são autobiográficos na chegada (walter hugo mãe).
– Às vezes as palavras são mais fortes que a realidade (Peter Esterházy, escritor húngaro, autor de Os verbos auxiliares do coração)
– Cheque gera inspiração, e antes que ela fosse embora, depositei correndo na minha conta bancária (João Ubaldo Ribeiro ao comentar a encomenda para escrever um livro sobre luxúria, para a coleção Pecados Capitais).
– Até quando o corpo pede um pouco mais de alma, a vida não pára (Elza Soares cantando os versos da música Paciência, de Lenine e Dudu Falcão, no show de abertura.)

Zedu Lima


18 Comentários

Luiz Magna

agosto 9, 2011 @ 14:04

Resposta

Parabéns Zedu!!!!
Incrível como vc soube sintetizar momentos inspiradores e emocionantes da 9ª FLIP… q bom conhecer e ouvir pessoas que enobrecem, valorizam a arte, engradecem o humano inerente a todos nós e pulverizam as esperanças de um mundo melhor!
Obrigado,
Luiz Magnabosco Jr –
Flonianópolis – SC

Maurício Mellone

agosto 9, 2011 @ 14:10

Resposta

Luiz:
O Zedu é mestre e soube, com um poder de síntese incrível, trazer o clima da Flip para os leitores
do Favo do Mellone!
Obrigado por sua participação aqui e volte sempre, vou adorar sua visita!
abr

Imad

agosto 8, 2011 @ 01:30

Resposta

Maurício, parabéns pela reformulação e pelo aniversário do site. Muito sucesso nesta já vitoriosa jornada. Fui também este ano à FLIP, o que venho fazendo há algumas edições. A festa literária esteve fantástica, o espírito e a atmosfera dela são inspiradores, e vale dizer que ano que vem será a edição comemorativa dos 10 anos da FLIP, e o homenageado será ninguém menos que o Carlos Drummond, talvez nosso maior poeta, não é mesmo!? Abraços e, de novo, sucesso!

Maurício Mellone

agosto 8, 2011 @ 14:23

Resposta

Imad:
Obrigado pelos elogios ao blog e parabéns por seu empenho e dedicação em participar da Flip. Gostaria muito de ir em 2012, tomara
q eu consiga. bjs

Christian

julho 31, 2011 @ 19:22

Resposta

Mesmo estando a alguns milhares de km de distância e nunca tendo participado da FLIP, a resenha do nosso amigo Zedu encoraja ainda mais meu interesse pelo evento.

Parabéns pelo blog!
Parabéns pela resenha!

Grande abraço,
Christian
(Zurique, Suíça)

Maurício Mellone

agosto 1, 2011 @ 11:42

Resposta

Christian:
Que ótimo receber seu comentário tão elogioso de tão longe!
Muito obrigado em meu nome e no do Zedu, um grande amigo e
agora meu colaborador por aqui.
abr e venha sempre visitar-me!

Angela Lopes

julho 31, 2011 @ 18:37

Resposta

Zedu

Maravilhoso!!
Sua belíssima e clara descrição sobre a Flip despertou ainda mais meu interesse por esse importante evento.

bjs,

Angela

Maurício Mellone

agosto 1, 2011 @ 11:45

Resposta

Angela:
O Zedu já recebeu inúmeros elogios, todos muito sinceros. Ele disse
que não tinha gostado tanto do texto, mas vcs estão discordando dele.
Eu já tinha discordado antes mesmo de publicar e receber o excelente
retorno de todos vcs!
Obrigado em nome dele e volte sempre visitar-me!
abr

Maristela Bignardi

julho 29, 2011 @ 12:45

Resposta

Zedú de mio cuore,

Ler seus textos faz o emocional bater no teto, sacou?

Agora, todo seu público aguarda o lançamento das “Pinceladas Matinais”, pois elas unem muitas pessoas que praticam o mesmo e primeiro gesto da manhã: ler suas ‘inteligentes’ palavras.
superbeijo!!!!
Maristuquinha

Maurício Mellone

julho 29, 2011 @ 14:33

Resposta

Maristela:
Compatilho de sua opinião sobre o Zedu; há tempos venho incentivando nosso amigo a lançar um blog ou site.
Além das Pinceladas Matinais, seria um espaço nobre para ele se expressar, publicar as crônicas dele e outros
projetos literários. Quem sabe com o nosso empurrão ele não se resolva!
Volte sempre me visitar
abr

Ediné Pereira Lima Conde

julho 22, 2011 @ 16:38

Resposta

Tratando-se de Zedu, só poderia ser emocionante!
Obrigada,

Maurício Mellone

julho 22, 2011 @ 17:19

Resposta

Ediné:
Temos um amigo em comum e a mesma opinião sobre ele, que
sempre tem uma visão bem peculiar sobre a Vida!
bjs e obrigado pela visita, venha sempre!

Jerson Dotti

julho 22, 2011 @ 14:30

Resposta

Mellone, parabéns pela conquista do aniversário de um ano com muitas ações e muita leitura. E ao Zedu parabéns pela síntese e sentimento do evento, que em poucas palavras nos dá a vontade de ter participado pela grandiosidade e profundidade. Abraços Jerson

Maurício Mellone

julho 22, 2011 @ 17:21

Resposta

Jerson:
obrigado pela força e agradeço tb em nome do seu parceiro e coautor do Na Medida Certa!
Também fiquei louco de vontade de estar em Paraty, quem sabe no próximo ano iremos
homenagear Drummond juntos com o Zedu!
bjs

Rica Lopes

julho 22, 2011 @ 14:23

Resposta

É isso aí Zedú e Mellone
“Precisamos ler, precisamos ler, precisamos ler”.
A leitura nos liberta.
Frequento a FLIP há varios anos e sempre ouço críticas de alguns participantes que tal FLIP foi pior que a anterior, que está morna, que está ácida, etc., mas concordo com voce. Independente dos temas abordados, a FLIP não perde sua essencia de incentivar a ler.
Pegando o alerta de Caryl Philips, acrescento que a importancia da FLIP está nas descobertas literárias e na troca de experiências de seus escritores, que nos faz correr às livrarias.
Parabéns Zedu! Voce sintetizou o que a 9ª FLIP ofereceu de aprendizado e emoção.
Bjs
Rica

Maurício Mellone

julho 22, 2011 @ 17:23

Resposta

Rica:
O Zedu realmente fez um belo trabalho de síntese e nos passou a
essência da Flip, ou seja, precisamos sempre nos recorrer à literatura!
bjs e obrigado pela visita!

Huáscar Nabuco de Abreu

julho 22, 2011 @ 14:15

Resposta

Gostaria de acrescentar mais um atributo de nosso amigo Zedu: escritor.
Aliás, já estava mais do que na hora de enviar mais algum combustível
para o prelo, não é mesmo ?
Parabéns Zedu, pelas suas palavras, realmente vc tem o dom de com
tão poucas, dizer tanto e conseguir deixar a todos nós que não
pudemos estar no FLIP/2011, com muita inveja de quem esteve.
Abraços,
Huáscar Nabuco de Abreu

Maurício Mellone

julho 22, 2011 @ 17:25

Resposta

Huáscar:
O Zedu é mestre mesmo. Também estou na torcida para que logo
a gente possa ler seu novo livro. E o prometido de crônicas, espero
que seja editado logo logo!
abr e obrigado pela visita. Volte sempre!

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