A Volta ao Lar de Harold Pinter: crítica mordaz à família

De em agosto 21, 2012

O diretor Bruce-Gomlevsky interpreta um dos filhos de Max, em brilhante atuação de Tonico Pereira

Em curta temporada paulistana (somente até o dia 9 de setembro), a montagem de A Volta ao Lar, considerada obra-prima do dramaturgo britânico Harold Pinter, estreou no Teatro Anchieta/SESC Consolação depois de temporada de sucesso no Rio. Além de ter contato com uma obra que põe a nu as relações familiares, o público paulistano tem a chance rara de conferir a perfornance de Tonico Pereira, que dificilmente se apresenta na cidade. A composição do ator para Max, o patriarca da família, é vigorosa e foi reconhecida pela crítica carioca, que o indicou ao Prêmio Shell como melhor ator.

Max (Tonico) fuma com os filhos Lenny (Bruce) e Teddy (Gustavo Damasceno) e o irmão Sam (Jaime Leibovitch)

Ao entrar, o público dá de cara com a sala da casa de uma família de operários ingleses. O inusitado é que esta família é constituída somente por homens: o patriarca Max (Tonico Pereira), seus dois filhos, Lenny, interpretado por Bruce Gomlevsky — que também assina a direção — e Joey (Milhem Cortaz), além de Sam (Jaime Leibovitch), irmão de Max. A relação entre eles não é nada amigável. E tudo se transforma com a chegada de Teddy (Gustavo Damasceno), o primogênito que estudou e é professor de filosofia nos EUA, que vem com sua esposa Ruth (Arieta Corrêa). Numa referência à parábola bíblica do filho pródigo, Harold Pinter inverte seu significado: ao invés do perdão do pai ao filho que deixou o lar com parte da herança e volta na miséria, na peça o pai não só recebe o filho com certo desprezo como passa a articular com os demais familiares a exploração do casal, inclusive mantendo, sem qualquer pudor, relações sexuais com Ruth. Por sua vez, a enigmática personagem de Arieta não é passiva no contato com a família: ao final provoca uma estonteante reviravolta na trama.

Arieta Corrêa é a enigmática Ruth, que desestrutura ainda mais o núcleo familiar

Com uma crítica mordaz às relações familiares, o autor usa de surrealismo ao esfacelar o sentimento de amor, seja o fraterno, seja filial ou entre os casais.

 

Pinter em A Volta ao Lar examina as relações familiares arquetípicas com grande intensidade e riqueza. Além do privilégio em poder trabalhar um clássico da dramaturgia mundial, esta peça é um ótimo exercício para ator e diretor poderem lidar com situações, silêncios e personagens tão ricos, complexos e instigantes, como esses”, diz Bruce Gomlevsky.

 

Escrita em 1965, a peça (traduzida por Millôr Fernandes) ainda provoca certo desconforto, muito em função da atitude amoral dos personagens. Este estranhamento provocado por Pinter também foi notado na montagem estrelada por Fernanda Montenegro e Sérgio Brito, em 1967. Mas o diretor acredita que a obra é atual “por dissecar a natureza complexa e ambivalente da vida familiar”.
Fotos: Guga Melgar


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