Ainda estou aqui: filme arrebatador de Walter Salles sobre os Paiva

De em novembro 14, 2024

 

 

Casal Rubens e Eunice Paiva (Selton Mello e Fernanda Torres) com os filhos caçulas

 

 

Ovacionado no Festival de Cinema de Veneza/2024 e escolhido para representar o Brasil como filme estrangeiro na cerimônia do Oscar do ano que vem, Ainda estou aqui, do diretor Walter Salles, estreou no país e lidera o ranking de bilheteria. As salas de exibição estão lotando e ao final o público aplaude muito! Constatei isto ontem: a sessão a que assisti ao filme no Cine Belas Artes estava lotada e os aplausos foram efusivos.

 

O filme parte da história autobiográfica de Marcelo Rubens Paiva e o roteiro, premiado em Veneza, é assinado por Murilo Hauser e Heitor Lorega e faz um recorte da história contada no livro, assim como da história — sombria e macabra — vivida pelos brasileiros após o golpe militar instaurado no país em 1964. A trama se passa em 1970 e retrata, inicialmente, a vida harmoniosa da família Paiva. Tudo se transforma a partir da prisão do engenheiro e ex-deputado Rubens Paiva e seu desaparecimento nos porões da ditadura militar brasileira. E Eunice, sua esposa, passa a lutar pela sobrevivência de todos. O casal é brilhantemente interpretado por Selton Mello e Fernanda Torres.

 

 

 

 

 

Rubens e Eunice felizes, antes do desaparecimento dele

 

A cena inicial funciona como prólogo do filme: Eunice boia tranquilamente nas águas oceânicas do Rio de Janeiro quando passa no ar ruidosamente um helicóptero do exército. A paz reinante até então sofrerá abalos fatais a partir daquele momento.

Corte e a trama revela o interior da família Paiva: o engenheiro Rubens convive em harmonia com Eunice e os quatro filhos (três meninas e o garoto). Além do cotidiano feliz de uma família de classe média abastada, o filme mostra as reuniões festivas em que os Paiva recebiam os amigos. O diretor Walter Salles quis evidenciar este clima vivido naquela casa, já que era amigo da família e também frequentador daquele lar.

 

 

 

 

 

 

 

 

Eunice tem casa invadida por agentes militares

 

Tudo se transforma a partir de então. Agentes do exército invadem a casa dos Paiva e Rubens é levado para prestar declarações. Eunice, sem saber das dimensões daquela invasão, espera pela volta do marido. No entanto, dias depois ela e a filha mais velha também são levadas para interrogações. Ela é exaustivamente interrogada e perde a noção de quanto ficou presa; finalmente é liberada e volta para casa. A partir deste momento, Eunice passa a ter noção do horror em que ela e a família estão submetidos e inicia um processo de retomada da vida deles.

 

 

 

 

 

 

Eunice luta pela sobrevivência da família

 

Uma das primeiras atitudes de Eunice, depois de vender um terreno em que pretendiam construir a casa dos sonhos, foi alugar o imóvel em que viviam e promover a mudança da família para São Paulo. Pessoalmente, Eunice foi estudar, formou-se em direito e se especializou nas questões indígenas e em direitos humanos. Lutou incansavelmente para desvendar o assassinato do marido.

 

 

 

 

 

Eunice na ficção e na vida real com atestado de óbito do marido

 

 

A trama tem um salto de 25 anos e revela um fato histórico: a liberação pelo Estado brasileiro do atestado de óbito de Rubens Paiva, verdadeira conquista de Eunice, pois é a comprovação de que seu marido foi cruelmente assassinado pelos militares, nos porões do exército nacional. Além de um roteiro sensível e uma direção cuidadosa, é preciso ressaltar a primorosa reconstituição histórica do filme e uma trilha sonora que contribui para o painel que o filme faz do Brasil.

 

 

 

 

 

Fernanda Montenegro vive Eunice na velhice

 

Entretanto o maior destaque do filme é para a interpretação de Fernanda Torres. Com sutileza no olhar e um silêncio interior ensurdecedor, ela se transforma de uma mulher alegre e voltada ao marido e aos filhos para uma guerreira, que precisa manter a lucidez no âmbito familiar e ao mesmo tempo lutar com todas as forças contra um sistema ditatorial. E já vítima de Alzheimer, Eunice é interpretada por Fernanda Montenegro, que sem uma palavra transmite o vigor daquela mulher na cena em que assiste na TV uma reportagem sobre o marido.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Num momento em que a direita e a extrema direita ganham força no país e no mundo (vide a eleição nos EUA), é mais do que oportuno lembrar para as novas gerações o terror que a ditadura militar causou para a sociedade brasileira. Ainda estou aqui pode contribuir para avivar a memória das pessoas e fazê-las entender que governos autoritários e truculentos não atuam dentro do estado democrático de direito. As liberdades individuais são sempre desprezadas por ditadores.

 

 

 

 

 

Fotos: divulgação


10 Comentários

SUELI ZOLA

novembro 18, 2024 @ 23:23

Resposta

Maurício, querido, amei a resenha. Ainda não vi o filme. Verei em breve

Maurício Mellone

novembro 20, 2024 @ 14:17

Resposta

Su, querida:
Não deixe de assistir, tenho certeza q vc irá se emocionar!
Beijos e obrigado pelo elogio e principalmente por sua visita!
Beijos

DINAH SALES DE OLIVEIRA

novembro 18, 2024 @ 22:12

Resposta

Maurício, querido,
Boa resenha, acho que passa exatamente o clima abafado e o peso daquela época!
Pena que ainda não vi o filme, mas a gente troca nossas impressões assim que eu for ao cinema.
Combinei com numa amiga de ver esta semana,
Beijos

Maurício Mellone

novembro 20, 2024 @ 14:18

Resposta

Dinah, minha amiga:
Vá logo, vc irá adorar. A Su tb disse q não assistiu
ainda. Depois podemos conversar sobre o filme
Beijos

Sofia Carvalhosa

novembro 18, 2024 @ 14:32

Resposta

Mauricio querido, resumiu com emoção o filme. Achei interessante ressaltar a cena de Eunice boaindo e o helicóptero voando. Não tinha reparado.

Maurício Mellone

novembro 18, 2024 @ 14:51

Resposta

Sofia, querida:
muito obrigado, segui sua dica e coloquei no
nosso grupo de WhatsApp o link da resenha.
O helicóptero me chamou muito a atenção.
Beijos, obrigado pela visita

Nanete Neves

novembro 14, 2024 @ 21:57

Resposta

Esse filme é mesmo tocante ao mostrar os danos da ditadura nas famílias. E, ao optar em são ser piegas nem melodramático, o diretor Walther Salles nos acerta em cheio. Assisti há dias e este filme ainda está em mim, doendo. Tua resenha é precisa, parabéns

Maurício Mellone

novembro 15, 2024 @ 15:13

Resposta

Nanete, minha querida:
Realmente o filme no toca profundamente e vc disse bem, sem ser piegas ou melodramático.
Muito obrigado por sua presença aqui no Favo, sempre com palavras de incentivo!
Beijos, minha amiga

Maria

novembro 14, 2024 @ 17:31

Resposta

Adorei a resenha, Maurício. Se já queria assistir esse filme, agira aguçou ainda mais minha vontade. Parabéns e bjs

Maurício Mellone

novembro 15, 2024 @ 15:14

Resposta

Rê, q bom q a resenha aguçou sua vontade de conferir o filme.
Tenho certeza q vc vai amar e se emocionar
Beijos, saudades

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