Cantagalo: romance de estreia da mineira Fernanda Teixeira Ribeiro

De em abril 17, 2025

 

Lançado pela Todavia, livro conta a saga de uma família mineira poderosa do início do séc XX 

 

 

Vencedor do Prêmio Revelação Literária concedido pela UCCLA (União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa), o livro Cantagalo/Todavia Editora, romance de estreia da jornalista e escritora mineira Fernanda Teixeira Ribeiro, se passa no início do século XX, em Alto Paranaíba/MG e narra a saga da família Lima, clã poderoso que possui uma grande fazenda de café. O que marca o destino desta família é o casamento arranjado entre uma herdeira branca (Praxedes) e seu primo rico (Eugenio), filho de uma escravizada com um homem branco. A partir daí, a autora conta a trajetória dos ascendentes e descendentes deste casal, com destaque ao destino das mulheres, além da vida de seus empregados e dos moradores daquela região, todos vinculados ao poderio dos Lima.

 

 

Com uma linguagem não linear, com idas e vindas no rumo desta família, a trama destaca o poder da herdeira, dona Praxedes, que, já viúva, mantém com rédeas curtas a vida das três filhas, Agripina, Tonica e Leopoldina. Por meio do histórico dos Lima, a obra também aborda questões sociais e as feridas deixadas pela escravidão e o sistema patriarcal do Brasil do final do século XIX e início do século XX.

 

 

 

Fernanda  é jornalista e doutora em Ciências do Desenvolv. Humano

 

 

Nascida em Uberaba/MG em 1984, Fernanda Teixeira Ribeiro é formada em Comunicação Social e doutora em Ciências do Desenvolvimento Humano.

Atua como pesquisadora no campo da neurobiologia das emoções e Cantagalo marca seu ingresso na literatura; ela se tornou a primeira mulher a receber o prêmio da UCCLA, que existe desde 2016.

 

 

 

 

 

 

Cafezais em Minas Gerais romance.

 

A obra é dividida em quatro partes, mais o epílogo, num total de 104 pequenos capítulos. A saga dos Lima é retratada como num caleidoscópio, com a narrativa construída de idas e vindas no tempo cronológico. Com certo cuidado e atenção, o leitor é obrigado a construir o painel histórico daquele clã e de uma infinidade de personagens, que são introduzidos no enredo até as últimas páginas do romance.

Outra característica marcante da autora é a construção peculiar dos diálogos, com o uso do discurso indireto livre, em que as falas e pensamentos dos personagens, e do narrador, aparecem de forma justaposta; é preciso atenção para descobrir quem fala com quem:

 

 

 

“Depois de apertar o pescoço, debaixo das orelhas, afirmo: Inapetência. É comum, fala-se muito disso na Europa hoje, doença de mulher.
— Não, não, estamos bem longe da Europa, senhor. Doença de mulher? Leopoldina é menina nova, sofre de sonhos maus porque não come, é isso, só pode ser. De qualquer maneira obrigada por me atender, perdão incomodar o senhor por isso.”

 

 

 

Em outra passagem, numa discussão entre os pais que Praxedes presencia, o  diálogo e a descrição da cena pelo narrador estão na mesma sequência:

 

 

“Despedaçou-se ela também em gritos e choro, tentou estapear o barão, mas foi contida sem esforço, pressionada contra a pintura da família, Eu posso te matar por falso testemunho se eu quiser, mas só vou fazer você limpar a bagunça; desceu-a pelo pulso até o chão, Cate, ela soluçava, Cate, meteu-lhe um pontapé nas costelas; mamãe se desequilibrou sobre os cacos, cortou-se. O barão se agachou para ver-lhe a mão, Desastrada; e você, Xede, por que está abaixada? eu não mandei ajudar sua mãe, se ela sujou tem que limpar. E se você se cortar aí sim vou ficar irritado.”

 

 

 

Ilustraç]ao: Ricardo Castro

 

Mais do que retratar o interior de uma família representativa das classes dominantes do início do século XX, a autora aborda bastidores e segredos das relações humanas da época, como casamentos arranjados entre primos — às vezes para escamotear incestos e abusos domésticos —, machismo (inclusive praticado pela matriarca), preconceito e racismo. Assim, a trama faz uma alegoria de um país com suas imensas desigualdades, infelizmente um quadro muito próximo do Brasil de hoje, 2025!

 

 

Com o rigor de seu estilo — narrativa não cronológica, uso de discurso indireto livre e profusão de personagens — a autora produz uma obra que pode cansar o leitor ou provocar certa confusão e incompreensão. Sugiro atenção redobrada na leitura, principalmente nos primeiros capítulos.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Ficha técnica:
Título: Cantagalo
Autor: Fernanda Teixeira Ribeiro
Editora: Todavia, 284 pgs
Preço: R$ 84,90

 

 

 

 

Fotos: divulgação

 

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