De Maurício Mellone em setembro 10, 2012
Registro de uma época. Assim poderia ser definido o novo filme de Ugo Giorgetti, Cara ou Coroa. Ambientada no inverno de São Paulo de 1971 — destaque para a criteriosa caracterização de época —, a trama faz um perfil daquele momento, mostrando tanto a truculência dos militares que haviam dado o golpe anos antes, assim como a esquerda com seu dogmatismo e uma visão um tanto limitada aos avanços estéticos e dos costumes sociais.
O filme gira em torno das aventuras do diretor de teatro João Pedro, vivido por Emílio de Mello, que ensaia O Interrogatório, peça de Peter Weiss, e ao mesmo tempo precisa lidar com a falta de dinheiro para pagar o aluguel, as discussões com a ex-mulher e a falta de sensibilidade de um integrante do Partido Comunista que não concorda com os rumos da peça, que é financiada em parte pela agremiação política. Além disto, João Pedro apoia o irmão mais novo Getúlio (Geraldo Rodrigues), que indeciso quanto ao futuro profissional, escreve uma peça teatral e ele tenta ajudá-lo. O jovem namora Lilian, interpretada por Julia Ianina, e ambos são levados a colaborar com a resistência política.
Ugo Giorgetti, que também assina o roteiro, dá a sua visão sobre aquele período conturbado da sociedade brasileira. Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, afirma:
A ditadura foi uma época complexa, tentei passar minha visão. A denúncia da brutalidade já se esgotou; quis buscar um outro caminho.”
E conseguiu. Em nenhum momento o espectador assiste a cenas de luta entre militares e civis ou atitudes de brutalidade. Há, isto sim, a tensão tão comum à época, mas também há a descontração quando João Pedro reúne os companheiros de teatro em noitadas pelos restaurantes paulistanos. A revolução dos costumes, a libertação feminina, a descoberta do amor e o desabrochar das vocações artísticas também são revelados no filme.
Dois personagens ajudam a contextualizar a época: de um lado o taxista, tio de João e Getúlio, vivido com maestria por Otávio Augusto e de outro o general reformado, avô de Lilian, interpretado por Walmor Chagas. O taxista é o típico homem de classe média, conservador e ao mesmo tempo sensível, que procura ajudar os sobrinhos. O general, mesmo convocado por comandantes da ativa, se nega a voltar ao exército, principalmente por não concordar com os rumos que a “revolução” tomou. Lilian e Getúlio são convencidos por João Pedro a dar refúgio a dois militantes da esquerda: eles levam os refugiados para o porão da casa do general. Giorgetti deixa no ar se o militar sabia ou não o que se passava em sua casa.
Além da interpretação primorosa do elenco, Cara ou Coroa se destaca pela estrutura narrativa: tudo se passa pelo olhar de Getúlio, que narra os acontecimentos do período em off. Paulo Betti dá a voz ao personagem.
Fotos: divulgação
6 Comentários
Sandoval
abril 20, 2019 @ 20:24
Filme muito bom gostaria de saber os nomea das musicas que passam no filme
Obrigado
Maurício Mellone
abril 22, 2019 @ 17:55
Sandoval:
Há muito postei esta resenha…. não saberia
dizer quais as músicas da trilha.
Talvez vc ache se pesquisar pelo filme ou pelo diretor,
Ugo Giorgetti.
Boa sorte
Abr
Tobias
julho 7, 2018 @ 20:42
Gostei muito do filme. Deu uma visão diferente de tudo que já se filmou ou foi escrito sobre a época. Sempre vemos clichês . Neste caso, parece que havia um mundo paralelo, sem muita pressão. Dez para mostrar uma nova forma da época.
Maurício Mellone
julho 10, 2018 @ 10:53
Tobias:
postei esta resenha sobre o filme do Giorgetti
há muito tempo!
Que bom q vc comentou o post do filme.
Volte outras vezes, há sempre novidades em cinema e teatro.
abr
Fátima Ribeiro
setembro 12, 2012 @ 16:58
Este filme tem uma outra forma de falar da ditadura. Gostei muito de ter feito. Obrigada por ter incluido no seu blog, o boca a boca é o que mais funciona. Beijão
Maurício Mellone
setembro 13, 2012 @ 14:46
Fátima:
Tb concordo com vc, o Giorgetti deu sua visão para aquele
período tão conturbado da história recente do nosso país!
Gostei muito do filme e não poderia de estar no Favo!
Bjs e sucesso!