De Maurício Mellone em maio 9, 2019
Duas situações dramáticas do cotidiano, bem distintas e separadas, que aos poucos o espectador consegue uni-las. Este o mote central da peça inédita no Brasil, Em um dia qualquer, da dramaturga escocesa Linda McLean, com direção de Carlos Baldim, que cumpre curta temporada (só até o dia 26 de maio) no Teatro Municipal Décio de Almeida Prado.
Cristina Cavalcanti (responsável pela tradução, figurino e visagismo) divide o palco com Fábio Mráz e Ricardo Ripa (o diretor faz uma pequena participação). Na primeira sequência, um casal que apresenta deficiência intelectual se prepara para receber a visita da sobrinha. Já a segunda situação, mais realista, mostra o affair entre o dono de um bar e sua funcionária. Questões e conflitos da sociedade contemporânea vêm à tona em ambas as situações e o espectador consegue tanto se identificar como unir os dois universos retratados.
O público entra e se depara com o palco dividido em dois: de um lado o apartamento do primeiro casal Bill e Sadie (Fábio e Cristina) que já estão em cena e de outro um bar, ainda vazio. Por apresentarem problemas mentais, Bill e Sadie vivem num universo que nos remete ao teatro do absurdo, estão à espera de Godot, no caso, da sobrinha. A situação de vida deles não impede que haja dominação, bullying, intolerância, perversidade e violência. Infelizmente tudo isto tão comum nos nossos dias, em nosso cotidiano.
A outra situação, vivida no lado oposto do palco, é bem mais realista. Dave e Jackie (Ripa e Cristina) já fecharam o bar, estão se preparando pra sair e o patrão insiste com a funcionária para que eles continuem a noite juntos. Jackie se vê dividida entre seu desejo pessoal e as obrigações que a vida lhe impõe, tanto com o filho doente que a espera como com os tios que moram sós e têm problemas mentais. Como típica mulher do século XXI, Jackie vive um misto de sentimentos, permeado por culpa e ressentimentos.
Considerada uma das mais importantes dramaturgas escocesas da atualidade, Linda McLean, para o diretor, retrata as agruras do nosso tempo:
“Ela traz, nesta peça, questões pertinentes aos dias de hoje, tal como o conflito de Jackie frente aos questionamentos vividos pela mulher dos nossos dias. O texto traz diferentes possibilidades de abordagens estéticas e propõe reflexões que ecoam com as demandas dos dias atuais”, explica o diretor.
Com uma dramaturgia provocativa e questionadora, Em um dia qualquer deixa o espectador preso à ação, do início ao fim. Destaque para o trabalho de composição de personagem de Cristina Cavalcanti e Fábio Mráz para o casal com problemas mentais — a atriz tem a chance também de mostrar toda a sua versatilidade, ao saltar de uma mulher velha, gorda, doente e submissa para uma garçonete sedutora, inteligente e dona de si. Cenário, figurino e iluminação são preponderantes na proposta de apresentar duas situações dramáticas diametralmente opostas, mas que se unem por retratar conflitos da sociedade contemporânea. Confira, só até o final deste mês.
Roteiro:
Em um dia qualquer. Texto: Linda McLean. Tradução e figurino: Cristina Cavalcanti. Direção: Carlos Baldim. Elenco: Cristina Cavalcanti, Fábio Mráz, Ricardo Ripa e Carlos Baldim. Cenário e construção cenográfica: Cesar Rezende (Basquiat). Iluminação: Junior Docini e Carlos Baldim. Trilha sonora original e sound design: L.P. Daniel. Fotografia: Rodrigo Menck. Produção: Selene Marinho. Realização: Visceral Companhia.
Serviço:
Teatro Décio de Almeida Prado (186 lugares), Rua Lopes Neto, 206, tel. 11 3079-3438. Horários: sábado às 21h e domingo às 19h. Ingressos: R$ 30 e R$ 15. Duração: 75 min. Classificação: 14 anos. Temporada: até 26 de maio.
4 Comentários
Ana Clara G. Schenberg
maio 11, 2019 @ 20:20
Gostei muito da peça, especialmente da direção do Carlos Baldim e da atuação da Cristina Cavalcanti , parabéns!
Maurício Mellone
maio 13, 2019 @ 14:10
Ana Clara,
muito obrigado pela visita.
Tb adorei a peça da dramaturga Linda McLean.
Volte outras vezes, procuro postar resenhas de teatro das
estreias. Um abraço e até breve
Fábio Mráz
maio 9, 2019 @ 19:04
Mau querido, obrigado pelo seu olhar, sempre sensível e preciso.
Bjs
Maurício Mellone
maio 10, 2019 @ 10:03
Fábio, querido:
já lhe disse pessoalmente e repito aqui:
parabéns duplamente, pela sensível composição
do Bill (que tem problemas mentais) e por
sua garra em voltar aos palcos!
Sucesso, sempre!
Bjs