Lady Tempestade: Andrea Beltrão interpreta advogada de preso político

De em junho 6, 2025

 

Andrea Beltrão protagoniza peça inspirada nos diários da advogada Mércia Albuquerque

 

Contar e recontar uma história é uma maneira de impedir
 que o horror aconteça de novo”, Andrea Beltrão

 

Esta frase resume bem o espírito do espetáculo Lady Tempestade que a atriz carioca Andrea Beltrão protagoniza: ela dá vida à advogada pernambucana Mércia Albuquerque, que nos anos de chumbo da ditadura civil-militar brasileira defendeu com unhas e dentes os presos políticos. A peça é inspirada nos diários que a advogada escreveu durante os anos de 1973 e 1974 em que relata os horrores que eram cometidos nos porões do regime autoritário da época, além das súplicas de famílias que procuravam por entes desaparecidos.

 

 

Com direção da atriz mineira Yara de Novaes e dramaturgia de Silvia Gomez, a peça, apresentada com grande sucesso no Rio de Janeiro, cumpre curta temporada no Sesc Consolação, só até 06 de julho, e depois continua a turnê pelo país: Belo Horizonte em agosto, Brasília em setembro e entre outubro e novembro estará no Recife, Natal, Fortaleza, Campina Grande e Maceió.

 

 

 

Atriz ao lado do filho, Chico Beltrão, que assina a trilha sonora

 

 

O público, ao entrar na sala de espetáculo, já encontra Andrea Beltrão sentada no fundo do palco, ao lado do filho Chico Beltrão, responsável pela criação e operação da trilha sonora. Com poucos elementos cênicos, a atriz inicia a peça contando como os diários chegaram até suas mãos: numa madrugada o telefone toca e do outro lado da linha uma voz masculina — R., referência a Roberto Monte que publicou os diários — avisa que ela irá receber uns documentos, os diários da advogada pernambucana.

 

 

 

A partir deste instante, a atriz se divide entre a personagem, denominada A. que passa a ler os diários, e a própria Mércia Albuquerque, que Andrea compõe com pequenos gestos e um leve sotaque pernambucano.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

“A peça não se trata de uma biografia ou reprodução literal da vida de Mércia Albuquerque, mas de uma invenção, uma ficção tendo como material principal o diálogo livre com os diários redigidos pela advogada nos anos 1973 e 1974. Inspiraram a dramaturgia também outras fontes, como entrevistas com Roberto Monte, Eliane Aquino, prima de Mércia, e o escritor Samarone Lima, além de áudios de Mércia, livros e documentários sobre a época”, explica Silvia Gomez.

 

 

 

 

Personagem A. lê os diários de 1973/1974

 

Numa dinâmica ágil, a atriz desenvolve a trama mesclando a dificuldade da personagem A. em encerrar a leitura dos diários — até a advogada riscou partes do relato e rasgou páginas — e a trajetória corajosa de Mércia, que enfrentava os militares (os chamava de gafanhotos) na defesa de seus mais de 500 clientes; Mércia foi presa 12 vezes, numa delas com arma apontada em sua cabeça.

 

 

 

 

 

 

O espetáculo estreou em 2024, exatamente 60 anos após o golpe militar. Durante a peça uma frase é ouvida várias vezes —essas coisas aconteceram, acontecem, acontecerão —, mostrando o elo entre passado, presente e futuro, o que faz com que o público se identifique com a narrativa. A tentativa de golpe em 8 de janeiro de 2023 é prova de que os ‘gafanhotos’ não foram exterminados; outro exemplo é a matança indiscriminada promovida pelas polícias estaduais e as infindáveis balas “perdidas”, que invariavelmente atingem a população pobre, preta e favelada deste país. A dramaturga fala como os tempos verbais são utilizados na peça:

 

 

 

 

A dramaturga Silvia Gomez

 

“Alguém do presente, como nós, recebe uma convocação do passado. De repente, na escrita, o tempo verbal tornou-se arisco: às vezes no passado, às vezes no presente, às vezes no futuro. Como se a forma pedida pela obra nos lembrasse que o Brasil é reincidente no esquecimento de sua história, tantas vezes parecida com uma cena em looping de terror”, diz Silvia Gomez.

 

 

 

 

 

 

Com uma direção focada na performance da atriz, Lady Tempestade se destaca pelo texto vigoroso inspirado na história de uma mulher guerreira e pela interpretação pungente de Andrea Beltrão, que ao final vai retirando partes do carpete do palco que escondem cartas. No programa da peça, ela diz que “fazer teatro é levantar o tapete e deixar o que está escondido aparecer, receber luz. Enquanto a gente se lembrar, existe a esperança de mudar o rumo da história”.

Ao final o público, impactado com a força do espetáculo, ovaciona a atriz e, em uníssono, grita: “Sem anistia!”
Infelizmente os paulistanos só têm até o início de julho para conferir a montagem, que tem longo roteiro a cumprir pelo país.

 

 

 

 

Roteiro:
Lady Tempestade. Dramaturgia: Silvia Gomez. Direção: Yara de Novaes. Elenco: Andrea Beltrão. Cenografia: Dina Salem Levy. Desenho de luz: Sarah Salgado e Ricardo Vívian. Figurinos: Marie Salles. Criação e operação de trilha sonora: Chico Beltrão. Identidade visual: Fábio Arruda e Rodrigo Bleque|Cubículos. Fotografia: Nana Moraes. Produção: Boa Vida e Quintal Produções. Direção de produção: Verônica Prates. Produção executiva: Camila Camuso. Realização: Sesc São Paulo
Serviço:
Sesc Consolação/Teatro Anchieta (280 lugares), Rua Dr. Vila Nova, 245, tel (11) 3234-3000. Horário: de quinta a sábado às 20h, domingo às 18h. Ingressos: R$ 70, R$ 35,00 e R$ 21,00 (credencial plena). Duração: 70 min. Classificação: 12 anos. Temporada: até 06 de julho.

 

 

2 Comentários

Adriana Bifulco

junho 9, 2025 @ 18:28

Resposta

Com certeza é um espetáculo impactante e, com a Andréa Beltrão, maravilhoso! O trecho da retirada das cartas do carpete deve ter sido demais!!

Maurício Mellone

junho 9, 2025 @ 18:31

Resposta

Adriana:
sem dúvida, a ceba das cartas retiradas debaixo do tapete é no final,
e muito bem articulada com a trama. Grande impacto e emoção.
Obrigado por sua visita, constante!
Beijos, se puder, vá assistir

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