De Maurício Mellone em outubro 28, 2024
Nossa memória é fugaz e seletiva. Ao assistir ao espetáculo Na lista dos vivos, em cartaz até 13 de novembro no Teatro do Cemitério de Automóveis, nem parece que todo o horror causado pelo coronavírus aconteceu há tão pouco tempo. Assistir a um homem chegar em casa vestido de botas, capa com capuz, luvas, óculos de proteção e máscara transparente de plástico, além de passar álcool nas mãos e em tudo que vai pegar, até parece cena de filme de ficção científica! No entanto, todos se identificam com esta imagem, fomos obrigados a agir desta maneira durante a pandemia.
Em cena Eucir de Souza encarna este personagem, que ao chegar em seu apartamento recebe um maço de cartas; depois de se desvencilhar do aparato de proteção, começa a ler uma por uma, que na verdade são as crônicas de Mario Viana, que revelam o próprio drama que viveu, da internação, as etapas do tratamento na UTI até a alta hospitalar e o início do longo processo de recuperação.
A peça é uma criação do ator, que convidou Mayara Ribeiro Guimarães para ser a dramaturgista e Márcio Mehiel para dirigi-lo. Na proposta cênica, o personagem recebe as cartas e cuidadosamente começa a leitura, uma por uma. E aí reside o grande trunfo do espetáculo: o texto do escritor e dramaturgo Mario Viana é primoroso. Suas crônicas — postadas originalmente em Vianices e depois no livro Minha Vida no Crime /Giostri — revelam o drama que viveu como paciente, mas sempre com uma pitada de humor, o que suaviza o tom trágico/dramático. O leitor e agora o espectador se emociona profundamente com o relato, porém o riso também é uma constante.
Além do teor comovente e necessário da mensagem de Mario Viana, é preciso louvar a iniciativa de Eucir de Souza em transpor para o teatro textos em prosa (crônicas). Sua atuação também é digna de destaque: consegue dosar a emoção e transmitir as nuances do texto, apesar do nervosismo de estreia. Um único senão: mesmo sendo da proposta da direção, o ator não se desprende das cartas, em nenhum momento. Talvez pudesse ao final lançar mão dos papéis para ficar mais próximo do espectador. A ‘mise-en-scène’/encenação e a trilha sonora também devem ser ressaltadas. Justicando o título da peça, Eucir ao final lê uma lista com nomes de alguns dos espectadores. Confira, a temporada é muito curta.
Roteiro:
Na lista dos vivos.Texto: Mario Viana, baseado nas crônicas do livro Minha Vida no Crime. Dramaturgista: Mayara Ribeiro Guimarães. Direção: Márcio Mehiel. Criação e atuação: Eucir de Souza. Trilha sonora: Brina Costa e Paulo Mutti. Iluminação: Bruno Caraíba. Figurino: Eucir de Souza. Fotografia: Ruy Fraga. Criação audiovisual: Dani Sandrini.
Serviço:
Teatro do Cemitério de Automóveis (50 lugares), Rua Francisca Miquelina, 155, tel. 11 2371-5743. Horários: terça e quarta às 20h. Ingressos: R$ 60 e R$ 30. Vendas: Sympla. Duração: 60 min. Classificação: 12 anos. Temporada: até13 de novembro.
Instagram: @na_lista_dos_vivos
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