De Maurício Mellone em setembro 23, 2014
Filha do rei de Portugal D. José I, Dona Maria I foi a única mulher que assumiu o trono português, em 1777. Conhecida em sua terra como A Piedosa e aqui no Brasil como A Louca, Dona Maria teve uma vida complexa, recheada de tragédias e pela primeira vez ganha uma leitura dramatúrgica em Palavra de Rainha, monólogo de Sérgio Roveri, interpretado por Lu Grimaldi e sob direção de Mika Lins, que está em cartaz no Teatro Viradalata.
Para o dramaturgo, Dona Maria, mãe de D. João VI, é um personagem trágico e complexo, que poderia ter sido criado por Shakespeare ou Eurípedes:
“Mas Dona Maria foi talhada pela vida, o que dá uma dimensão real a suas dores, dilemas e poucos e pequenos prazeres. Primeira mulher a assumir o trono de Portugal, precisou no início aprender a administrar o legado de tirania deixado pelo pai. Depois, quase no fim de sua vida, abandonou às pressas sua pátria rendida diante das tropas de Napoleão, além de suportar a mais implacável das dores para uma mulher: a perda dos filhos. Que esta peça possa servir de um convidativo cartão de visita desta mulher com quem a história foi tão pouco generosa”, argumenta Sérgio Roveri.
O grande impacto do espetáculo é sem dúvida o cenário, que é praticamente constituído do figurino da rainha: ao abrir das cortinas, o espectador se depara com a atriz no centro do palco, trajando um grandioso vestido negro que ocupa todo o espaço. Ao mesclar ficção e fatos reais, a peça traça um perfil da monarca portuguesa:
“Em meio a tragédias pessoais, como a perda de cinco dos seis filhos, e os anos de reclusão no Palácio de Queluz, Dona Maria governou Portugal por 22 anos e fez valiosas contribuições à cultura. Morreu em 1816, aos 81 anos, no Rio de Janeiro, cidade em que ela, no meio dos seus delírios, acreditava ver o diabo escondido atrás do Pão de Açúcar”, relata a atriz Lu Grimaldi.
Com uma movimentação limitada, em função da própria idade da rainha e principalmente pelo vestido/cenário que em alguns momentos funciona como o mar revolto, a personagem faz relatos de sua trágica existência, como os anos que viveu reclusa, os seus primeiros delírios, a perda dos filhos que morreram de varíola, da fuga da família real para o Brasil em 1808 e seus últimos anos, em que ficou num convento no Rio de Janeiro, até sua morte.
Personalidade histórica pouco lembrada, Dona Maria I em Palavra de Rainha é resgatada e o público tem acesso a sua sofrida trajetória de vida. Além do texto apresentado de maneira não linear que obriga o espectador a montar o painel da vida da rainha portuguesa, chamou a minha atenção o belo cenário e figurino assinado por Cassio Brasil, a sensível direção da também atriz Mika Lins e a generosa interpretação de Lu Grimaldi, que dá vida a uma personagem tão importante para a história luso-brasileira.
Quero ressaltar também a casa de espetáulo: o Teatro Viradalata foi criado em 2011 e no ano passado foi ampliado. Além da sala bem equipada e de bom tamanho, o espaço ainda possui um saguão para exposição e um aconchegante restaurante e lanchonete. Ótima opção de cultura aliada ao lazer.
Fotos: Lenise Pinheiro
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