De Maurício Mellone em maio 9, 2017
O problema persiste: filme nacional, se não obtém grandes bilheterias nas primeiras semanas de exibição, fica reduzido a poucas salas e mínimas sessões. Não é diferente com Por trás do céu, que entrou em cartaz recentemente e hoje está sendo exibido somente em uma sala (Caixa Belas Artes), numa única sessão. Uma pena, pois o filme de Caio Sóh é poético e de extrema sensibilidade.
A trama, baseada em uma peça do próprio diretor, retrata o cotidiano de um casal que vive num casebre no topo de um rochedo, localizado numa região paupérrima do sertão paraibano. Aparecida, interpretada por Nathalia Dill, é uma mulher criativa e com uma rica imaginação, mas que se entedia de ficar restrita àquele fim de mundo; já Edivaldo, vivido por Emílio Orciollo Neto, é um rústico sertanejo e apaixonado pela mulher, mas leva uma vida amargurada em razão de uma tragédia ocorrida no passado. A chegada de Micuim (Renato Góes), amigo deles, e da prostituta Valquíria (Paula Burlamaqui) altera radicalmente a vida do casal.
Numa espécie de prólogo, Aparecida trava uma conversa com Deus, questionando seu destino de viver presa àquele lugar. Nas cenas seguintes, o espectador passa a conhecer um pouco da vida dela, que com as sucatas que ganha do marido constrói seu universo onírico, recheado de objetos ornamentais, roupas, fantasias, utensílios e até asas para sua tartaruga. Isolada do mundo, Aparecida quer conhecer a cidade, sonha em voar e saber o que se passa por trás do céu, o que deixa Edivaldo sem ação — ele não compreende o porquê da obsessão da mulher em ganhar o mundo.
Aquele isolamento tem uma razão de ser: intercalando presente e passado, o diretor revela como eles se conheceram e tudo o que provocou o afastamento do casal do convívio social. A chegada de Micuim traz ânimo ao casal: além de pequenos presentes, o rapaz assume o papel de intermediário e apaziguador entre eles. Já Valquíria, que foge dos maus tratos do cafetão (Roberto Bomtempo) que a explorava, também interfere no cotidiano deles, graças a sua vivência na cidade.
O que chama a atenção no roteiro, também assinado pelo diretor, é o retrato do universo daquelas pessoas que vivem isoladas da sociedade: mesmo com certa dose de ingenuidade e ignorando o pragmatismo do mundo contemporâneo, Aparecida, Edivaldo e Micuim têm consciência do que é o amor, amizade, lealdade, religiosidade e são fiéis a estes sentimentos humanos mais profundos. Além da aprimorada composição de personagem de Nathalia e Orciollo, o destaque fica para o pernambucano Renato Góes, que dá vida ao autêntico e histriônico Micuim.
Fotos: divulgação
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