De Maurício Mellone em julho 11, 2025
Um crime nada comum: num apartamento de luxo de um edifício do bairro dos Jardins na capital paulista, quatro membros de uma mesma família são encontrados mortos. Um delegado e seu assistente são convocados para desvendar o mistério. Este o mote central de Receita fatal, romance policial do médico infectologista Jacyr Pasternak, lançado pela Editora Labrador.
O inusitado do caso é que na cena do crime não há qualquer sinal de violência, nem arrombamento de portas e muito menos indício de suicídio. As primeiras hipóteses levantadas pelos investigadores e peritos são de infecção por vírus ou bactéria ou então mortes por envenenamento.
Formado pela Faculdade de Medicina da USP, com especialização em hematologia e infectologia, Jacyr Pasternak ocupou diversos cargos em instituições públicas, inclusive o de diretor do Hospital do Instituto de Assistência ao Servidor Público Estadual. Além de obras da área da medicina, Pasternak é autor dos romances policiais Assassinato na Alameda Campinas e Tio Zulmiro não se chamava assim.

Em sua terceira imersão no mundo da ficção policial, Pasternak desta vez retoma o personagem de suas outras obras, o delegado Francisco — seria seu alter ego? —, que hoje é o titular da delegacia dos Jardins, que ele mesmo define como “bem arrumada, diferente de muitas outras. Temos móveis decentes, cadeiras sentáveis, computadores mais modernos. Está instalada numa das tais casas sobreviventes do bairro, em condições razoáveis”. O livro, com 144 páginas, é composto de um prefácio assinado pela infectologista Rosana Richtmann, do prólogo, 16 capítulos curtos e um epílogo, que dá pistas de que haverá novo romance.
A trama é narrada pelo delegado Francisco (não gosta de ser chamado de Chico e nem de chefe), que com seu assistente Gilberto, chegam ao apartamento dos Marques da Cruz e constatam que todos estão mortos — o casal Carlos e Maria Olímpia, o primogênito Henrique e a caçula Laura. A primeira atitude de Francisco é ouvir a empregada Emerenciana, que encontrou o cadáver da patroa, e o zelador Marcondes, que constatou as outras mortes. Os peritos da medicina legal foram logo acionados e, como não havia provas evidentes de assalto ou assassinato, as hipóteses recaíram para infecção ou envenenamento.
A história é contada por meio do desenrolar e evolução das investigações do caso. Antes dos resultados das autópsias e das amostras recolhidas pelos peritos, Francisco e Gilberto passam a ouvir os sócios e funcionários da empresa de Carlos, assim como profissionais que atendiam a dona da casa, como nutricionista, mestre de ioga e feng shui, ortomolecular, ozonioterapia, além de especialistas em plantas e produtos naturais. Tudo para saber se algo pode ter causado intoxicação.
Em Receita fatal, mais do que o desfecho de um crime, Pasternak, com sua vasta experiência em infectologia e sua ironia sutil, faz uma crítica aos procedimentos médicos que não possuem comprovação científica.
“A obra mistura mistério e comédia em doses letais. E no final, a única cura possível será uma boa gargalhada e uma crítica bem afiada ao mercado de medicina alternativa”, declara Rosana Richtmann.
Duas passagens do livro me deixaram incomodado. A primeira é a forma generalizada de criticar as práticas médicas não convencionais por meio da voz do delegado (seria o alter ego do autor?). E por fim, a postura machista do personagem central, a forma como se refere à Marisa da polícia científica (loiríssima, corpo de modelo, um metro e noventa de altura. O que é que uma mulher como esta faz na polícia? / Um mulherão como ela não fica ignorado / Mulher sem-vergonha, como eu gosto). Nos dois trechos, não há um contraponto, ninguém contradiz o delegado, nem a policial contesta o machismo.
Ficha técnica:
Título: Receita fatal
Autor: Jacyr Pasternak
Editora: Labrador, 144 pgs
Preço: R$ 39,90
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