De Maurício Mellone em outubro 25, 2016
Depois do sucesso de público e de crítica do espetáculo CAIS ou Da Indiferença das Embarcações, a Velha Companhia está de volta com a peça Sínthia, resultado de dois anos de pesquisa e que acaba de estrear a nova temporada no Espaço dos Fofos até 14 de novembro.
Da pesquisa e do processo colaborativo entre os membros da Cia, Kiko Marques — que também assina a direção e é o protagonista da trama — criou o espetáculo tendo como base sua experiência de vida:
“Sempre partimos de algo pessoal. Desse flerte com a realidade e a memória, criamos a dramaturgia, que termina por descolar-se da memória. Fui esperado como menina por minha mãe, naquela época não se sabia o sexo do bebê até o nascimento. A peça tem origem nesta experiência: de uma mulher encarcerada num mundo machista, do paradigma da repressão como forma de amor e da questão da identidade de gênero, resolvi criar uma obra que falasse de compaixão”, explica Kiko Marques.
A trama tem seu início em pleno período da ditadura militar no Brasil, nos anos 1960: o oficial do exército Luis Mário e sua mulher Maria Aparecida, interpretados por Henrique Schafer e Denise Weinberg, já tinham três filhos homens e na quarta gravidez de Maria todos esperavam por uma menina, que se chamaria Sínthia; mas veio outro garoto, Vicente, interpretado por Kiko Marques. A ação retrata a saga desta família de classe média, intercalando cenas do passado (com a participação do patriarca nas investidas paramilitares da época e o sofrimento de Maria em criar sua prole) e o presente, com o drama de Vicente em conciliar o cuidado da mulher e da filha (vividas por Virgínia Buckowski) sem poder se distanciar da mãe, que sofre de doença grave. A peça discute tanto as consequências do autoritarismo da ditadura na vida das pessoas como a questão da transgeneridade nos dias atuais.
“O espetáculo fala de uma transformação necessária e sobre a incapacidade de aceitar aquilo que não se possui. Escrita em 2014, a obra se mostra atual e imprescindível pela maneira como a intolerância, alicerçada em certezas e interesses, vem se tornando o modo principal de nos relacionar tanto no campo pessoal como no social”, desabafa o dramaturgo.
Com poucos objetos cênicos (assinados por Chris Aizner) que são manipulados pelo próprio elenco nas diversas mudanças de época, a montagem é centrada na composição e no drama dos personagens. Está aí o grande destaque do espetáculo, graças à interpretação visceral e tocante da grande atriz Denise Weinberg, que divide a cena primeiramente com Henrique Schafer e depois com Virgínia Buckowski e os filhos, vividos por Willians Mezzacapa, Marcelo Marothy, Marcelo Diaz e Kiko Marques.
A história é emocionante e envolve o espectador; no entanto, poderia ter sofrido um corte e ficar mais enxuta e concisa, o que só traria benefícios para o resultado final. Mesmo assim, o espetáculo é impactante e prova como o envolvimento da equipe durante todo o processo de criação é fundamental para a melhor realização de uma obra teatral.
Fotos: Lenise Pinheiro
2 Comentários
Kiko Marques
outubro 30, 2016 @ 01:26
Obrigado, Maurício pelas palavras e pelo olhar.
Maurício Mellone
outubro 31, 2016 @ 10:39
Kiko,
Obrigado pela visita
Sucesso na segunda temporada de ‘Sinthia’
abrs