De Maurício Mellone em maio 3, 2016
Depois de já ter sido retratada na literatura e nos palcos— no início do ano o ator e diretor Daniel Lobo voltou à cidade com sua homenagem à psiquiatra —, Nise da Silveira ganha uma cinebiografia pelas mãos do documentarista Roberto Berliner. Em Nise – o coração da loucura, o diretor, no entanto, faz um recorte na vida da médica psiquiatra de Alagoas e o filme começa exatamente quando Drª Nise, interpretada por Glória Pires, chega para se reapresentar (depois de cumprir prisão decretada pela ditadura Vargas) no Centro Psiquiátrico do Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro, em 1944. Como a médica se recusa a utilizar os métodos até então praticados com doentes mentais (lobotomia e eletrochoque), ela é designada para dirigir o STO (Setor de Terapia Ocupacional). E é lá que, com amor, atenção e carinho, Nise da Silveira introduz um método revolucionário em que os clientes (como ela fazia questão de chamar os pacientes) passam a se expressar por meio de trabalhos de artes plásticas. São as imagens do inconsciente retratadas em quadros, esculturas e desenhos.
Com roteiro assinado por Flávia Castro, Maurício Lissovsky, Maria Camargo e Chris Alcazar, o espectador tem a chance de acompanhar todo o processo de trabalho de Nise no centro psiquiátrico, desde o embate com o diretor (interpretado por Zecarlos Machado) e os demais médicos que usavam eletrochoque como tratamento, o início no STO (começou literalmente com a limpeza da sala), a chegada dos primeiros pacientes, a descoberta da arte como forma de tratamento até a primeira exposição pública dos quadros e esculturas dos pacientes.
Além de ser discriminada dentro do corpo clínico do hospital, Drª Nise também enfrentou dificuldades com os funcionários para introduzir seu método, que era baseado no tratamento humanizado (sem violência e maus tratos). A relação com os pacientes também precisou ser construída passo a passo, já que até então todos recebiam tratamentos invasivos e violentos. Entretanto, tudo se modifica quando Nise aceita a sugestão de Almir (Felipe Rocha) para introduzir telas, tintas e demais aparatos de artes plásticas para trabalhar com os pacientes. Aos poucos eles não só se acalmam como começam as primeiras experiências artísticas, que são criteriosamente observadas e relatadas pela médica para o famoso psiquiatra Carl Gustav Jung. Outra personalidade que se encantou com o trabalho da Drª Nise foi o crítico de arte Mário Pedrosa (vivido por Charles Fricks), que promoveu a primeira exposição pública dos novos artistas brasileiros.
Sem dúvida o grande destaque do filme é para o trabalho de composição dos atores para os pacientes; difícil salientar um em detrimento dos demais. Roney Villela (Lucio Noeman), Claudio Jaborandy (Emygdio de Barros), Fabrício Boliveira (Fernando Diniz), Simone Mazzer (Adelina Gomes), Flavio Bauraqui (Octávio Ignácio), Julio Adrião (Carlos Pertuis) e Bernardo Marinho (Raphael Domingues) emocionam com suas performances. E Glória Pires dá vida à famosa psiquiatra com humanidade e verossimilhança, ressaltando tanto o lado doce e amoroso com que lidava com os seus clientes, como seu temperamento determinado e arretado, como boa nordestina que era!
Com prêmios no Festival de Tokio/2015 (filme e atriz) e no Festival do Rio do ano passado (júri popular), Nise – o coração da loucura é um belo retrato da psiquiatra alagoana, que precisa estar sempre na lembrança dos brasileiros!
Fotos: divulgação
4 Comentários
Imad Nasser
junho 8, 2016 @ 18:02
Querido Mau,
só ontem assisti ao filme; gostei dele a acho sua resenha, como sempre, muito fiel e coerente com a obra analisada. Parabéns, sempre, por este qualificado espaço cultural.
Maurício Mellone
junho 9, 2016 @ 11:55
Imad,
Estava sentindo falta de sua presença aqui no Favo!
Muitíssimo obrigado pelos elogios e pelo incentivo.
Glória Pires encarna com brilhantismo a grande Nise da Silveira.
bjs e até breve
Nanete Neves
maio 3, 2016 @ 16:10
Esse filme já estava na minha lista. Com este teu texto então, agora é pra ontem! Parabéns pelo belo trabalho que você faz no estímulo à cultura.
Maurício Mellone
maio 3, 2016 @ 16:33
Nanete,
fico muito contente, o incentivo vindo
de vc é muito gratificante!
O filme é muito bom: a Glória não precisa nem dizer!
E os atores q interpretam os pacientes/clientes artistas
são emocionantes!
Bjs e obrigado pela força, sempre!