De Maurício Mellone em fevereiro 2, 2017
Depois do sucesso de público — última semana com ingressos esgotados —, a primeira montagem de O Bote da Loba, peça escrita por Plínio Marcos dois anos antes de sua morte, tem a temporada estendida até o final de fevereiro. Em cartaz no Teatro Garagem, o espetáculo é dirigido por Marcos Loureiro e se passa numa sessão de tarô, em que a cigana vidente Veriska, interpretada por Anette Naiman, tem a missão de recuperar sua paciente Laura, vivida por Luciana Caruso, uma mulher da alta sociedade, casada e que reclama de depressão e dores abdominais. Na realidade, ela é reprimida sexualmente e a cigana, com seus poderes místicos, tenta ajudá-la a se libertar de tanta repressão, machismo e conceitos internalizados de uma sociedade patriarcal.
A peça começa com Laura deitada numa espécie de divã, falando ininterruptamente sobre sua depressão, suas dores, angústias e sofrimentos. A cigana, sentada à direita da paciente, é só ouvidos, até o momento que não suporta mais tanta lamentação e dá um basta. Laura se assusta com a investida da vidente, que é incisiva e aplica algumas de suas técnicas para acalmá-la. Mas precisa saber se a paciente quer mesmo ser ajudada; com o consentimento, Veriska dá o diagnóstico certeiro: Laura necessita mesmo se libertar de suas amarras sexuais, abandonar aquela postura de só se submeter ao marido, sem nunca ter chegado ao orgasmo. Tudo dito de forma ríspida e até agressiva para que a paciente se conscientize de sua realidade e pare de mentir para si mesma.
“Plínio Marcos foi um homem de seu tempo, retratou a visão da sociedade de sua época. Por isto seus textos tornaram-se clássicos da dramaturgia brasileira, pois revelam valores, costumes e pensamentos da sociedade. Nesta peça, o prazer feminino, reprimido até hoje, é discutido abertamente por Plínio”, esclarece Anette Naiman.
O que sobressai no espetáculo é a sintonia entre as atrizes, principalmente nas cenas em que há embates entre a cigana e a paciente, até o desfecho surpreendente. Tanto Anette como Luciana têm chance de mostrar as diversas facetas das personagens. No entanto, a sala do teatro em que acontece a montagem (Caixa Preta de apenas 30 lugares) não favorece a performance das atrizes. Em determinadas marcações de palco definidas pela direção, uma atriz impede que alguns espectadores possam assistir adequadamente o desempenho de sua companheira de cena.
O texto de Plínio Marcos, mesmo um pouco datado (será que hoje ainda há tantas mulheres reprimidas sexualmente como a personagem da trama?), toca em temas de extrema importância, independentemente do período histórico. Machismo, submissão feminina, violência doméstica, intolerância e preconceito devem ser sempre combatidos.
Fotos: Lenise Pinheiro e Gal Oppido
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