O sonho, conto de Dinah Sales de Oliveira

De em dezembro 22, 2011

Dinah, escritora, jornalista e principalmente minha amiga

Nada melhor do que receber presente. Ainda mais quando coincide com os festejos de fim de ano! A jornalista e escritora Dinah Sales de Oliveira, companheira desde os tempos de facu (como hoje a galera se refere ao curso na universidade), é a portadora deste mimo; seu conto O sonho é singelo e tocante, muito propício para o astral do mês de Natal. Dinah, muito obrigado, você mais do que ninguém sabe do carinho e dedicação que venho tendo com este espaço. E poder contar com os amigos do coração aqui é mais do que gratificante! Boa leitura e comentem tanto sobre a participação da minha amiga como do Favo como um todo!

O sonho
Júlia acordou com o estômago em desassossego e uma lembrança vaga do sonho. Estava no vôo 1681, com destino a São Paulo. Deixara para trás uma semana de descanso e risadas em POA, o que talvez fosse uma previsão saudável para o ano que começava.

Gostava de pensar que os últimos dias do ano eram sempre uma prévia do que viria no próximo. Pequenas bobagens.
Os amigos, as crianças, as hortênsias na serra, os sapos anunciando chuva, a felicidade do filho aprendendo a tirar leite e o horizonte moldurando o Cânion Fortaleza eram um bom começo – pensou.
Mas não teve certeza de nada, já que o sonho fora curto e interrompido pela turbulência.
Fechou os olhos tentando entender o que estava sentindo e a imagem veio aparecendo aos poucos.
Um anjo sobrevoou as fileiras de poltronas e entre as asas abertas ela viu as nervuras quase transparentes.
Estavam na 19ABC e sentiu a baba úmida no encosto. Então, lembrou-se da hora em que o anjo roçou o seu cocuruto.
Anjos têm os pés cor-de-rosa – notou.
O sonho era bom ou ruim?
Júlia olhou em volta. A aeromoça, com cabelos tingidos e olhos grandes, vestia uniforme desenhado por estilista.

– A senhora aceita uma revista?

Júlia não se sentiu incomodada. Ossos do ofício de comissária de bordo. E pensou que, com essa idade, não tinha cara nem jeito de senhora.
Um homem, com o rosto apoiado na mão esquerda, firmou o braço no compartimento de bagagens. Cabelos fartos, apesar da idade. Deve ter sentido medo da chuva e da sensação de montanha russa sem trilho, quando o avião fez a primeira queda brusca. E ficou um bom tempo com a cabeça abaixada.

– Está rezando? Pensa na mulher e no filho que não pode abraçar agora?

A moça ao lado parecia dormir tranquila, com o iPod ligado.
Foi então que a voz da criança ficou mais clara.

– Quando é que começou a cantar?

Júlia olhou para trás e viu o menino, não sabia que música era aquela, mas se lembrou que já havia reparado no garoto de lábio leporino bem costurado. A impressão de nariz adunco era por causa da boca corrigida? O formato ideal para uma caricatura talvez lhe incomodasse quando homem.
Ela gostou do guri. Também tinha um filho – que estava encostado ao pai e levemente enjoado.
Júlia fechou os olhos e o anjo voltou.
Além da nervura nas asas abertas e dos pés cor-de-rosa roçando o seu cabelo, viu a fenda nos lábios, que ainda não tinham sido costurados.

Dinah Sales de Oliveira

Fotos dos anjos: imagens Google


12 Comentários

Roseli Pedroso

dezembro 14, 2018 @ 16:37

Resposta

Caí nesse blog por acaso. Como acredito que acaso não existe, estou feliz demais em conhecer esse espaço e ter a grata surpresa em ler esse belo conto. Parabéns Dinah! Escreve lindamente. Parabéns Mellone por esse espaço de divulgação de nossa cultura. Vou virar freguesa!

Maurício Mellone

dezembro 14, 2018 @ 17:26

Resposta

Roseli,
que ótima surpresa! E que maravilha que vc gostou
do Favo. Terei o maior prazer em recebê-la, sempre!
bjs

Sueli

janeiro 6, 2012 @ 22:27

Resposta

LIndo o conto/sonho da Dinah. Tão suave, dá vontade de voar.. Obrigada Maurício por divulgar essa delicadeza. Bjs

Maurício Mellone

janeiro 9, 2012 @ 14:31

Resposta

Su, querida:
Nossa amiga hesitou muito em enviar-me o conto (insegurança de artista); e é
encantador!!!!!
Bjs e obrigado pela visita!

Luiz Carlos Líbano

dezembro 27, 2011 @ 01:59

Resposta

Nada como a doçura de um sonho angelical numa época tão propícia a mantermos os nossos sonhos atentos e fortes. Que o Natal de Dinah, o seu Maurício e o dos frequentadores do blog tenham sido serenos como esse conto e lindos como as imagens que o acompanham.
Luiz.

Maurício Mellone

dezembro 27, 2011 @ 14:18

Resposta

Luiz:
Muito obrigado e retribuo desejando
um ano novo de alegrias e muita paz interior!
Saúde e sucesso!
Vou avisar à Dinah do seu comentário delicado!
Bjs e feliz 2012!

Zedu Lima

dezembro 23, 2011 @ 18:15

Resposta

Dinah,

seu pequeno conto tem a sabedoria de reconhecer o leitor como um ser pensante. Você não explicita as situações, apenas insinua. Gosto muito disso. Parabéns!
Quero avaliar mais pepitas de lavra.

Um grande beijo,
Zedu

Maurício Mellone

dezembro 23, 2011 @ 18:18

Resposta

Zedu:
Tb adorei o conto da Dinah: singelo e profundo!
E ela demorou para se animar e ter coragem para publicar!
Insegurança do artista!
Bjs

Dinah Sales de Oliveira

dezembro 23, 2011 @ 19:38

Resposta

Zedu,
Obrigada pela observação sobre meu conto!
No momento, as pepitas estão com as pontinhas de fora, mas falta polimento para que apareçam de ‘corpo inteiro’. Dar asas a outros textos está na lista de afazeres para o novo ano.
E Maurício acertou quando disse que demorei para ter coragem de publicar.
Se é ‘insegurança do artista’, acho que devo me tranquilizar, então.
Até Fernanda Montenegro confessa um friozinho na barriga a cada nova atuação.
(rsrsrsrs)

beijos aos dois,
Dinah

Maurício Mellone

dezembro 26, 2011 @ 14:42

Resposta

Dinah:
Obrigado pelo carinho e, como já disse, agradeço também
pela confiança em publicar seu conto no Favo!
Adorei sua meta para o ano novo: “das asas a outros textos”!
Essa meta tb faz parte da minha listinha para o ano!
Bjs e que 2012 possa contar com mais colaborações suas!

Dinah Sales de Oliveira

dezembro 22, 2011 @ 19:39

Resposta

Maurício,
Parece que assim, editado e com imagens (lindas, as que vc escolheu), o conto ganha outro corpo. Estou sem palavras agora…
Agradeço o carinho, o companheirismo de todos esses anos e o compartilhar de sonhos que não estão em canto nem em conto nenhum.
Você merece muitos mimos. Fico feliz que tenha recebido meu conto como presente.
Sucesso e vida longa para o Favo!

um beijo carinhoso,
Dinah

Maurício Mellone

dezembro 23, 2011 @ 14:27

Resposta

Dinah:
Foi mais q um mimo, foi um presentão de carinho e confiança
no blog!
Muito obrigado e vamos em frente, sempre juntos!
bjs

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