De Maurício Mellone em abril 19, 2017
O filme de Marcelo Gomes — mesmo diretor de Madame Satã/02 e Cinema, Aspirinas e Urubus/05 — Joaquim, que acaba de estrear, pode contribuir para a reflexão e a tentativa de entendimento do momento de crise política e institucional porque passa o Brasil atualmente. A trama acontece 10 anos antes da Inconfidência Mineira, que teve Tiradentes como mártir e herói deste movimento libertário. Na época o país vivia o declínio da exploração do ouro e era governado por uma elite corrupta e autoritária, que subjugava a população composta por mestiços, índios e africanos escravizados. Corrupção é mesmo um mal deste país, desde os tempos da colonização!
Joaquim José da Silva Xavier, interpretado por Júlio Machado, além de dentista rudimentar era alferes do exército da monarquia e saía em missões de captura de contrabandistas de ouro. Ele ansiava por uma promoção e era apaixonado pela negra Preta (vivida pela atriz portuguesa Isabél Zuaa), que fugiu de seu amo para se juntar a outros ex-escravos em quilombos. Joaquim era amigo de alguns escritores (os inconfidentes), que lhe davam livros sobre movimentos libertários nos Estados Unidos; ele ficou muito influenciado por este ideário e logo se engajou no levante contra a corte portuguesa.
O prólogo do filme é bem peculiar e audacioso, com a imagem do busto de Tiradentes, que em off conta brevemente sua trajetória de vida e indaga por que somente ele, dentre os inconfidentes, tenha sido assassinado; será que por ser o único pobre do grupo?
A trama dá um salto na história e mostra o alferes em plena atividade de combate aos contrabandistas, além de mostrá-lo extraindo dentes das pessoas e de seu romance com Preta. Como ansiava por uma promoção, ele é convocado a uma missão para explorar novas minas de ouro no temido Sertão Proibido. Joaquim reúne uma pequena tropa — constituída do mestiço Januário (papel de Rômulo Braga), do escravo João (interpretado por Welket Bungué, ator nascido em Guiné) e pelo também alferes Matias, vivido pelo ator português Nuno Lopes — e partem para a arriscada empreitada. Depois de muitas dificuldades, desavenças e traições entre os membros da equipe eles resolvem voltar, mas antes passam numa fazenda e Joaquim descobre algumas pedras semipreciosas numa cachoeira local.
De volta à Vila Rica (hoje Ouro Preto), Joaquim sabe que sua promoção não saiu, suas pedras têm pouco valor (de acordo com seus superiores) e a situação precária do país permanece a mesma, com desmandos, impostos altíssimos e exploração desmedida! Ele, então, começa a se interessar pelas ideias libertárias da América do Norte, graças aos livros que ganha de amigos intelectuais e fidalgos (os que iriam criar o movimento de levante contra os portugueses).
Na pré-estreia do filme, o diretor diz que sua obra é uma ficção imaginária fundamentada em documentos históricos. Ele quis investigar como um funcionário da coroa portuguesa resolve se insurgir, talvez por ter convivido de perto com aqueles que mais sofreram com o autoritarismo da corte. “Meu filme mostra a gênese do herói. Joaquim era um homem comum, que com sua experiência de vida se tornou um revolucionário”, argumenta o diretor.
O filme estreia exatamente na semana em que se comemora a morte de Tiradentes. Uma boa oportunidade para que todos nós possamos refletir sobre a história do Brasil e, quem sabe, repensar a realidade atual em que vivemos.
Fotos: divulgação
Deixe comentário