De Maurício Mellone em outubro 23, 2012
Considerada a obra prima de William Shakespeare, a montagem da tragédia Hamlet — que acaba de estrear no TUCA — tem o mérito de trazer para os nossos dias o enredo de crime, traição, corrupção e vingança que o dramaturgo britânico criou há mais de cinco séculos.
Isto só foi possível graças ao brasileiro Ron Daniels, que começou sua carreira (como ator) no Teatro Oficina de Zé Celso Martinez Correa, mas que em Londres, já como diretor, esteve à frente da Royal Shakespeare Company por 15 anos e hoje é diretor-associado da companhia especializada no autor.
Shakespeare foi homem de teatro que escrevia um inglês rico, porém gostoso, para ser falado com naturalidade e para ser entendido pelo público. Por que, então, traduzir ou encenar o texto de forma rebuscada? Por que não traduzir o seu teatro de forma natural e gostosa de falar o português? Quanto mais acessível e direto for o texto em português, melhor, para que possamos entender com facilidade o que está sendo dito e para servir a um teatro ao alcance de todos”, diz o diretor, que traduziu a peça em parceria com Marcos Daud.
Na pele de Hamlet, Thiago Lacerda encara seu primeiro Shakespeare. A seu lado estão Antonio Petrin, Selma Egrei, Eduardo Semerjian, Roney Facchini e mais dez atores.
No programa da peça o diretor salienta que o enredo de um crime abominável, cercado de corrupção moral não é privilégio do reino da Dinamarca, na época em que Shakespeare concebeu a peça. Este é um enredo que conhecemos muito bem — vide os crimes que a suprema corte brasileira acaba de julgar em Brasília — e que poderia ter sido escrito hoje, tanto em Stratford-on-Avon (terra do dramaturgo), como em São Paulo ou em qualquer localidade do mundo.
Por isto que mais do que retratar o drama de Hamlet, a montagem de Daniels enfatiza a crise existencial daquele rapaz. Abalado inicialmente com a rapidez com que a mãe casa-se com o cunhado logo após a morte do rei, seu pai, Hamlet não se contém ao saber, por meio do fantasma do pai, que houve um assassinato. Cláudio, que acabara de ser empossado pelo Conselho de Estado como novo monarca, matou o irmão e usurpou o trono real. Indeciso, mas com determinação, Hamlet jura vingança e luta para desmascarar os vilões, culminando com um final trágico.
O que mais chamou minha atenção em Hamlet foi justamente o estado de angústia, prostração e crise por que passa o personagem central. As aflições e dúvidas do rapaz são transferidas ao público: a gente deve se acomodar diante de injustiças, traições e vilanias ou se rebelar e lutar contra este estado de coisas?
Aqui vale o registro: Thiago Lacerda está totalmente entregue ao personagem e imprime verdade e comoção em cada palavra que profere. Não tenho dúvida em afirmar que é seu grande trabalho em teatro, um marco em sua carreira. Mas quero destacar também a atuação sempre brilhante de Antonio Petrin, que vive dois papéis, o fantasma e o primeiro ator da companhia que se apresenta no palácio real. Roney Facchini, como Polônio e, principalmente ao interpretar o coveiro (um matuto mineirinho), revela o humor shakespeariano e provoca gargalhadas da plateia.
Hamlet sem dúvida é um dos grandes espetáculos do ano. Não perca, a peça está em cartaz até o dia 16 de dezembro.
Fotos João Caldas
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