De Maurício Mellone em fevereiro 21, 2018
Um recorte sobre a trajetória sofrida do dramaturgo, poeta, ator e roteirista Antonin Artaud. Esta a proposta cênica de Gabriela Mellão, autora e diretora da peça DesolaDor, que traz Clovys Torres em marcante composição do artista francês. O espetáculo está em cartaz no SP Escola de Teatro. A trama foi construída a partir da correspondência trocada entre Artaud e o psiquiatra Ferdière, diretor do manicômio Rodez, onde o artista ficou internado por anos (1937 a 1946). Mostrando os últimos anos de vida de Artaud, o ator se apresenta de torso nu e coberto por uma cola branca, que vai se descolando durante a peça, numa referência à decomposição física e mental daquele homem.
Além das sessões, a equipe promove às segundas-feiras, depois do espetáculo, um bate papo entre a plateia e convidados especiais sobre a obra de Artaud e sua relação com a arte, a psicanálise e a finitude humana.
Para uma plateia de apenas 50 pessoas, a montagem enfatiza o confinamento, numa alusão ao período de internação de Artaud no hospital psiquiátrico Rodez. O ator entra em cena sem qualquer iluminação; um foco de luz sobre ele determina o início do espetáculo: já como um paciente do manicômio, Artaud discorre sobre as agruras de sua existência enquanto caminha sobre uma linha que delimita o espaço cênico. Mesmo estando sob tratamento extremamente invasivo — as sessões de eletrochoque eram comuns naquela época —, o artista revela-se lúcido e questiona vida e morte (sente-se vivo morto, morto sempre vivo). Artaud também não dissocia a vida real da ficção e a montagem enfatiza a fase final da vida do artista, sua desagregação física e psíquica pela dor. Daí a importância da película de cola sobre o corpo do ator: durante a peça ele se esfrega para retirar aquela camada intrusa, que também vai se soltando numa referência à decomposição humana.
O espetáculo impressiona graças a sua plasticidade. Além do efeito da cola no corpo do ator, a iluminação é um elemento narrativo crucial, com ênfase para as sessões de eletrochoque. O grande destaque da montagem é a parceria entre Gabriela Mellão — que além da dramaturgia, direção, trilha e cenário, divide a luz com Alexandre Stockler — e Clovys Torres, que com sua interpretação visceral revive no palco um dos mais significativos artistas do século XX. Sem dúvida um grande momento da carreira do ator.
Roteiro:
DesolaDor. Texto, direção e cenário: Gabriela Mellão. Elenco: Clovys Tôrres. Iluminação: Alexandre Stockler e Gabriela Mellão. Trilha sonora: Gabriela Mellão. Fotografia: Giorgio D’Onofrio.
Serviço:
SP Escola de Teatro (60 lugares), Pr. Franklin Roosevelt, 210, tel. 11 3775-8600. Horários: sexta às 21h30; sábado e segunda às 21h e domingo às 19h. Ingressos: R$ 40 e R$ 20. Duração: 50 min. Classificação: 14 anos. Temporada: até 19/3.
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