De Maurício Mellone em outubro 17, 2019
Em continuidade à pesquisa de linguagem iniciada com o premiado espetáculo anterior, Adeus, Palhaços Mortos, o grupo agora renomeado ultraVioleta_s apresenta a ousada montagem Há dias que não morro, em cartaz somente até o dia 27 de outubro no Espaço Cênico do SESC Pompéia.
Sem qualquer referência de tempo e lugar, três mulheres, interpretadas por Aline Olmos, Laíza Dantas e Paula Hemsi, estão inseridas num cubo-mágico-jardim e de forma repetitiva escancaram a rotina diária de suas vidas. O espetáculo foi concebido e dirigido de forma coletiva entre as atrizes e o diretor José Roberto Jardim a partir do texto de Paloma Franca Amorim.
Antes de entrar na sala, os espectadores, no hall do teatro, já se deparam com uma instalação, em que a performer Mauriceia Rocha está deitada, vestida de palhaço, exatamente na porta; o espectador precisa passar por ela para entrar. No programa da peça há uma indagação provocativa que complementa a proposta do espetáculo: “Quem quase morre está vivo. E quem quase vive? Por favor, não pise o palhaço”.
Na trama, ou no que se poderia chamar de trama, as três mulheres vivem um dia inteiro, do acordar ao amanhecer, passando pelas tarefas corriqueiras até o entardecer e anoitecer, quando voltam a dormir. As ações e textos são repetidos exaustivamente, numa coreografia constante e metódica. O ritmado movimento das luzes projetadas no cubo contribui para definir a rotina das personagens. Sutilmente há pequenas alterações das falas e gestos e a primeira daquelas mulheres para de atuar (será a morte?). Sem mudanças ou reações diante deste fato novo, as outras duas continuam suas ações/vidas; novamente a segunda começa a alterar suas falas e gestos e também interrompe tudo. A terceira mulher, sem modificar seu comportamento, permanece em sua rotina até também vir a ficar estática. O desfecho é surpreendente, com o desmonte total de tudo o que se viu até então. A autora, ao comentar a repetição de falas, gestos e movimento de luzes e cores incita a uma reflexão sobre vida e morte:
“Eu me explico melhor pela analogia do cubo-mágico: quantas vezes o quadradinho azul terá que dar voltas no cubo para encontrar seus pares e finalizar o jogo? Quantos espantos encerrarão se, em meio a todas as vezes que ele se repete sob o olhar do jogador, numa delas, for possível por mágica ou teatralidade tornar-se vermelho?”, provoca Paloma Franca Amorim.
Espetáculo provocativo e de grande impacto visual, em que há perfeita sincronia entre iluminação (com seus movimentos circulares), trilha sonora, coreografia e interpretação das atrizes. Figurino (Carolina Hovaguimiam) e visagismo (Leopoldo Pacheco) também merecem ser ressaltados, pois são elementos fundamentais para a criativa e talentosa produção do grupo ultraVioleta_s. A quebra de expectativa no final é outro destaque da montagem (provocar a volta à realidade?) e o público ao sair da sala é mais uma vez surpreendido com a performance do palhaço. O espetáculo, de intensos 50 minutos, fez uma pré-estreia em maio na Turquia e encerra a primeira temporada no próximo dia 27/10. Mas retorna em novembro no Galpão do Folias. Confira!
Roteiro:
Há dias que não morro. Idealização: Academia de Palhaços & ultraVioleta_s. Direção e concepção: Aline Olmos, José Roberto Jardim, Laíza Dantas e Paula Hemsi. Texto: Paloma Franca Amorim. Encenação: José Roberto Jardim. Elenco: Aline Olmos, Laíza Dantas e Paula Hemsi. Cenografia: Bijari. Direção musical e trilha sonora original: Rafael Thomazini e Vinicius Scorza. Iluminação: Paula Hemsi. Figurino: Carolina Hovaguimiam. Visagismo: Leopoldo Pacheco. Preparação corporal: Maristela Estrela. Fotografia: Paula Hemsi e Victor Iemini. Produção executiva: Tetembua Dandara.
Serviço:
Sesc Pompeia, Espaço Cênico (50 lugares), Rua Clélia, 93, tel. 113871-7700. Horários: de quinta a sábado às 21h30, domingo às 18h30. Ingressos: R$ 30, R$ 15 e R$ 9. Duração: 50 min. Classificação: 12 anos. Temporada: até 27 de outubro.
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