De Maurício Mellone em maio 19, 2016
Peça inédita de Sérgio Roveri em curta temporada no SESC Santana, a comédia dramática Não contém glúten ganha uma montagem minimalista pelas mãos do diretor José Roberto Jardim, em que o casal Sue e Michael, interpretados por Bia Seidl e Pascoal da Conceição, está prestes a receber a visita de um casal de amigos, Dorothy e Henry.
Num verdadeiro jogo de aparências — eles estão elegantemente vestidos e contentes, mas escondem velhas intrigas e frustrações —, o contato com os amigos e a diferença de vida entre os dois casais fazem com que Sue e Michael reavaliem suas vidas e o amor que ainda sentem um pelo outro.
“A peça é um mergulho, muitas vezes cruel, na intimidade de um casal que não atravessa o melhor momento de sua relação. Diante de visitantes que parecem desfrutar de uma realidade idílica, os donos da casa são obrigados a encarar a insignificância do seu dia a dia”, atesta o dramaturgo Sérgio Roveri.
Com gestos mínimos e restritos a um pequeno espaço, Sue e Michael a todo o momento procuram demonstrar e aparentar como estão felizes, principalmente diante do sucesso e da boa situação que se encontram seus velhos amigos, que não aparecem em cena mas os diálogos e a presença são reproduzidos pelos anfitriões. No entanto esta aparência de felicidade esconde um mar de frustrações: os diálogos com os visitantes deixam vir à tona o ciúme, o fracasso profissional, o trauma pela falta de filhos, a incapacidade com a administração doméstica e a alergia a glúten, expressa no título da peça.
Além da restrição espacial e física, os atores nem se tocam, os únicos movimentos são o levantar e o de sentar em confortáveis poltronas. Com esta proposta minimalista o diretor quis evidenciar a real situação vivida pelo casal:
“Minha função como diretor é conduzir o público a um outro estado perceptivo, por isso busco desenhar nas cenas ritmos e atmosferas sonoras que valorizem mais o que está submerso do que o comumente dito pelos personagens. Confinar os atores numa pequena área, fazendo-os desenhar o espaço apenas com suas vozes e tons, é o pedal que utilizo para que o desgaste e a perversidade da relação desse casal cheguem até o espectador de maneira profundamente cáustica, potente e angustiante”, afirma José Roberto Jardim.
Além do texto recheado de humor corrosivo que provoca reflexão e uma direção impactante, a montagem de Não contém glúten se vale muito da precisa iluminação (também assinada pelo diretor) e do rigor e da competência cênica de Bia Seidl e Pascoal da Conceição — um exercício e tanto de interpretação! O vestido de Lino Villaventura que Bia usa também é deslumbrante e merece destaque, pois a personagem fica ainda mais elegante e luxuosa. O espetáculo fica em cartaz somente até o dia 12 de junho, não perca.
Fotos: Victor Iemini
4 Comentários
Ricardo Hochberg
maio 19, 2016 @ 15:19
Como outras pessoas falam, “menos é mais” e não foi necessário investir em cenários ou ter o outro casal contracenando. Os diálogos e a duração da peça foram suficientes para a análise da vida, o que é comum, quando os amigos tem condições socioeconômicas diferentes.
Maurício Mellone
maio 19, 2016 @ 17:06
Ricardo,
sim, menos é mais, e o Jardim soube
bem aproveitar desta verdade na concepção do
espetáculo!
Obrigado por sua visita e comentário
abrs
Fábio Mráz
maio 19, 2016 @ 12:10
Muito bom!
A direção do Zé Jardim é maravilhosa e evidência com muita competência o grande talento do Pascoal e da Bia.
Imperdível!
Maurício Mellone
maio 19, 2016 @ 14:33
Fábio,
Um conjunto de talentos: autor, diretor e atores!
Obrigado por sua constante presença por aqui!
bjs