De em abril 6, 2011
Tarde de sábado chuvosa, com um friozinho do outono paulistano, fui surpreendido na academia com uma pergunta vinda de um garoto:
— É bom ser adulto?
Depois de uma bela risada, respondi perguntando:
— Mas não é bom ser criança?
O garoto, muito falante e desembaraçado para os seus pouco mais de 10 anos, respondeu divagando que ser adulto “deve ser muito bom!”
Novamente devolvo a bola, perguntando o porquê. Ele mais do que depressa responde:
— Por que não precisa mais estudar!
Rio novamente e digo que adulto não precisa mesmo mais estudar, mas precisa trabalhar. Sem rodeios ou qualquer dificuldade para rebater-me, o menino diz que para ele não vai ser nada chato trabalhar, pois será um cantor.
Ensimesmado, pude rir muito com o garoto, que logo estava pronto para ir embora, mas fez questão de perguntar meu nome. Disse com naturalidade e agora era ele que caía na gargalhada. Pergunto por que estava rindo e ele me diz:
—Esse é o nome do meu pai!
Não podia deixar que fosse embora sem saber seu nome. Ele diz com belo sorriso no rosto:
— Nicolas, e se despede educadamente, demonstrando mais uma vez que no fundo tem muito mais experiência de vida do que aparenta sua idade cronológica.
Depois desse agradável diálogo, voltei-me para minhas reflexões. Tinha acabado de sair da piscina, de um treinamento regular auto-imposto, justamente na semana em que mais um sinal dos anos acumulados nas costas tinha aparecido na minha vida. Depois de meses monitorando o funcionamento irregular da tireoide, minha médica havia receitado o medicamento que irá me acompanhar pelo resto de meus dias!
Com o compromisso de me manter saudável e com o mínimo de controle sobre a crise dos “enta”, fui pego de calças curtas pelo Nicolas!
Se estou preocupado em envelhecer, ou pelo menos chegar sem solavancos à tal da melhor idade — mantenho rígido controle alimentar, bebidas alcoólicas só com moderação, além da prática regular de exercícios físicos —, o garoto sonha de olhos abertos com a vida adulta! Alegre ironia!
Só mesmo o poeta para me tirar desse beco com infindáveis saídas! Fui correndo ouvir a canção de Carlos Renó, brilhantemente interpretada por Ney Matogrosso, Lema:
“Envelhecer
Certamente com a mente sã
Me renovando
Dia a dia, a cada manhã
Tendo prazer
Me mantendo com o corpo são
Eis o meu lema
Meu emblema, eis o meu refrão”.
Nicolas, ser adulto é saber envelhecer. Vamos juntos chegar lá?
Ilustração: Ricardo Castro
10 Comentários
Maria Lígia Pagenotto
outubro 17, 2011 @ 21:25
Mau, amore, gostei muito deste texto e cheguei a ele vasculhando o seu blog. Pena que não entro mais aqui, tanta coisa boa.. Não conhecia a música do Carlos Renó, mas sabe que esse assunto envelhecimento tem muiiito a ver comigo, por vários motivos. E que venham mais crônicas, e que eu entre mais neste blog!
Beijos com muita saudade de vc. Precisamos nos ver.
Lígia
Maurício Mellone
outubro 18, 2011 @ 16:42
Lígia:
Também estou com saudades! Venha sempre me visitar, é sempre prazeroso suas palavras delicadas e
perspicazes.
Bjs
Laura Fuentes
maio 9, 2011 @ 16:47
Terrível esse Nicholas, não? Mal sabe ele que jamais devemos parar de estudar. Quando paramos, morremos um pouco a cada dia.
Maurício Mellone
maio 10, 2011 @ 15:08
Laura:
Mas vc sabe q eu morri de rir da espontaneidade do garoto! Ele é uma graça
e hiper-bem-articulado para a idade dele. Depois que (ficar adulto),
sua lição de vida vai calar muito no Nicolas Adulto! bjs e obrigado pelas
visitas constantes!
Ricardo Castro
abril 19, 2011 @ 14:40
“Quero saber o que mais, ao perder, eu ganhei. Por enquanto não sei: só ao me reviver é que vou viver.”
Clarice Lispector
cara! Sua crônica me fez lembrar o meu sobrinho, tão espontâneo e questionador deve ter puxado o tio rsrsrs.
forte abraço Mellone.
Maurício Mellone
abril 19, 2011 @ 16:47
Ricardo:
Vc não imagina o qto o garoto, ao me questionar, provovou inúmeras questões internas. Por isso a crônica!
obrigado pela visita e venha sempre me visitar!
Obrigado pela ilustração mais linda!
Dinah
abril 10, 2011 @ 13:16
Maurício,
Nesse domingão de cara pouco simpática, duas surpresas: a sua crônica sobre envelhecer bem (ótima!) e o comentário da Silmara Franco.
Demorei pra perceber que eu mesma é que tinha feito a ponte, quando te passei o endereço do blog dela. Que bom que já estão trocando figurinhas!
O tom dessa sua crônica está diferente das outras, justamente porque não é uma ‘sinopse’, né? Fiquei imaginando vc lá na piscina tendo essa conversa séria com o Nicolas. Por que eles sempre querem ficar adultos logo? Esse aí diz que é pra não estudar mais… Nós também queríamos crescer e ser adultos o mais rápido possível, lembra? é esse sentimento que perpassa sua crônica, a história que se repete e a criança que nos põe em xeque com perguntas desse tipo. Muito terna, adorei! E fechar com o Ney caiu como uma luva. bjs.
Maurício Mellone
abril 12, 2011 @ 14:16
Dinah:
Pra mim que sou tio e não pai, responder ao Nicolas (garoto hiper-esperto)
foi engraçado! Fiquei bem natural, pois ele veio até mim dessa forma, aberto
e comunicativo! Depois vi ele saindo e cumprimentando a todos, como “gente grande”!
Foi tão surpreendente esse contato que não resisti e fiz a crônica!
E sobre a Silmara, o blog dela é ótimo, com agradáveis crônicas!
Bjs e obrigado pela frequência assídua!
Silmara Franco
abril 7, 2011 @ 18:34
Meus filhos dizem a mesma coisa. Querem ser adultos para não ir à escola. Eles se decepcionam quando digo que a gente nunca deve parar de estudar – embora eu mesma não tenha estudado desde que terminei a faculdade (no melhor estilo “Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço”). Eles também acham que é bom ser adulto porque adultos assistem TV na hora que querem, e também porque dirigem carros. Nesse ponto, até eles têm razão. Cada um deveria saber a dor e a delícia da idade que tem.
Gostei do blog, Mauricio!
Obrigada pela visita lá no meu.
Beijos!
Maurício Mellone
abril 8, 2011 @ 14:28
Silmara:
Retribuo os elogios, seu blog é criativo, bem-humorado e muito agradável!
Serei seu leitor assíduo!
Sobre os garotos e o sonho de envelhecer, ao final da crônica digo q
todos nós precisamos saber ser adultos, ou seja, saber envelhecer. Estou
aprendendo, aos trancos e barrancos! rsrsrsr
bjs