De Maurício Mellone em janeiro 23, 2018
Numa coprodução Brasil/Argentina, o filme de estreia da diretora e roteirista Caroline Leone, Pela Janela, é totalmente centrado no drama de Rosália, brilhantemente interpretada por Magali Biff, uma operária de uma fábrica de reatores na periferia de São Paulo. Com 65 anos, Rosália é chefe de produção e, depois de décadas trabalhando na empresa, um dia, no meio do expediente, recebe o comunicado de sua demissão. Morando só com o irmão Zé, vivido por Cacá Amaral, ela fica sem chão e entra em depressão. A solução encontrada por Zé é levá-la em sua viagem a Buenos Aires: ele é motorista de uma família rica e precisa levar o carro novo da filha dos patrões que estuda e mora na capital argentina. Relutante no início, Rosália aos poucos durante o trajeto vê novo sentido de viver.
O filme começa mostrando o cotidiano de Rosália, desde o seu despertar, os preparativos do café da manhã, sua ida e chegada ao trabalho (ela é quem abre e fecha a empresa), seu desempenho profissional, até sua volta pra casa e seus afazeres domésticos. Uma vida rotineira, sem grandes horizontes, que a diretora registra com planos fechados, com foco na ação da personagem. Daí a razão da depressão de Rosália ao saber que está demitida: sem saber o que fazer, ela se recolhe na pequena área de serviço de sua casa e fica lá até ser encontrada pelo irmão. Sem ter com quem deixá-la e precisando viajar no dia seguinte, Zé arruma tanto a sua mala como a de Rosália e praticamente a obriga entrar no carro. Ela ainda tenta uma reação, mas aceita o conselho do irmão, ‘esta viagem vai lhe fazer bem’.
A diretora sabe utilizar em sua produção o velho ensinamento, menos é mais: com poucos diálogos, gestos diminutos e o enquadramento fechado, o espectador vai penetrando no universo restrito de Rosália, que pela janela do carro começa a vislumbrar, aos poucos e lentamente, o mundo à sua volta. As cenas nas Cataratas do Iguaçu têm uma função fundamental na narrativa e no movimento de recuperação de Rosália: se no começo ela estava com medo, a grandiosidade e a beleza das cataratas a invadem e este banho dá início ao seu renascimento.
Como todo road movie, Pela Janela também se desenvolve durante a viagem dos irmãos a Buenos Aires — os idosos argentinos que se divertem num restaurante de beira de estrada e contagiam os dois viajantes, o cotidiano no hotel em que eles ficam e a festa dos velhos amigos de Zé. No entanto, o grande movimento que acontece é no interior de Rosália, que consegue vislumbrar novas perspectivas de vida ao se permitir ter novas experiências. E a personagem só ganha esta dimensão humana graças a magistral interpretação de Magali Biff: o olhar e a sutil alteração de fisionomia marcam a transformação daquela mulher comum e tão próxima de cada um de nós.
Não deixe de conferir.
Fotos: divulgação
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