Vermelho Vivo: segundo livro de poesias de Déborah de Paula Souza

De em dezembro 22, 2022

Déborah de Paula Souza lançou pela Editora Laranja Original seu livro de poemas

 

 

Escrever sobre quem escreve me dá um grande prazer, que começa no mergulho das tramas e das histórias e no mundo mágico das palavras e dos livros. Quando quem escreve é conhecido do público, a responsabilidade das minhas palavras nas resenhas é tamanha. No entanto, quando quem escreve eu conheço há décadas, a responsabilidade ganha uma dimensão insana!

Este é o caso. A jornalista, poeta e hoje psicanalista Déborah de Paula Souza faz parte da minha história: nos formamos em jornalismo pela PUC/SP, fomos profissionais da mesma empresa e, principalmente, amigos da vida toda. Daí minha dificuldade de escrever sobre Vermelho Vivo, lançado pela Editora Laranja Original, seu segundo livro de poesias — o primeiro, Moça Mousse Musselina foi lançado em 1982 pela Editora Pindaíba. A dificuldade reside na intenção de transmitir na resenha a profundidade e o lirismo das poesias do livro e retratar a sensível e criativa escritora que a minha amiga é. Mas vou tentar; meu trabalho será mais leve graças ao desapego da própria poeta:

 

estas palavras nunca foram minhas/
a poesia é dona de si mesma/
e distribui suas senhas faiscantes

 

 

Déborah é jornalista, poeta e psicanalista

 

Como bem lembra a jornalista e escritora Leusa Araujo ao final do livro, Déborah não revela a data das poesias. Como há um intervalo de 40 anos entre uma obra e outra, fica a cargo do leitor imaginar quando cada poesia foi criada ou em que fase da vida a autora escreveu. O que importa é o caráter atemporal, universal dos poemas.

a poesia está depois/
ou é anterior à escuta?

morrer é ininterrupto/
a vida é matéria bruta

 

 

 

 

 

Vermelho Vivo é dividido em seis capítulos e traz 96 poemas: Relâmpagos, A Morte do Amor, Entre os Mundos, Palavra Pólen, A Carta da Imperatriz e Bicho. Em Relâmpagos estão poemas curtos, profundos, leves e líricos:

 

Flor de sândalo

 

 

 

 

 

 

 

felicidade

o coração preenchido
a alma limpa
e o dorso arranhado

broto
o esplendor e a morte
já estão ali

guardada na semente
a flor espera

No segundo capítulo, A Morte do Amor, por mais paradoxal que seja, o lirismo extravasa e mostra todos os tons e nuances:

até quando acaba
acho o amor bonito

Já em Entre os Mundos Déborah discorre sobre dualidades e oposições, como vida e morte, loucura e sanidade, novo e velho, realidade e fantasia. Imagens poéticas são o que mais me chamam a atenção:

fome
o ovo de santa clara
a gema das coisas todas
o sol os amarelos
as gérberas na sala

No quarto capítulo, Palavra Pólen, a poeta e a psicanalista aparecem unidas pela palavra, pela escuta, pelo amor a Clarice Lispector e a Freud:

no divã
sussurros e gritos
inventam o  mapa-adentro
freud receitou
palavras como ungüentos

 

lispector

ao que era vago, deu nome
ao que eu temia, sentido
você ninou meus pecados
e remendou meus vestidos

No penúltimo capítulo, A Carta da Imperatriz, a mulher, a amante, o humor, a paixão e as dores do amor vêm à tona. No entanto em bárbara, o amor de mãe nos arrebata:

Imperatriz, carta do tarô

por você meu peito
se encheu de leite e espuma
eu desdobrei
a linhagem
das mulheres

uma
a
uma

 

Ao final, em Bicho, a triste realidade advinda da pandemia atinge em cheio a poeta e a jornalista toma as rédeas:

 

o confinamento humano
repete o mesmo padrão
do confinamento animal


a genética dos cadáveres
não interfere
no banquete fúnebre


o axioma
asfixia e respira
a fábula arfante
do mundo
e seu preâmbulo:

num sopro
a criança destrói
o dente-de-leão

 

 

Déborah, mulher de seu tempo, não dá as costas à realidade. O meio ambiente, os povos originários, a mulher como motor da vida, dentre tantos outros temas, estão em sua poética. Depois de ler, reler e ler novamente os poemas de Vermelho Vivo, continuo inebriado por tanto lirismo e amor. E é com esta emoção que redigi a resenha, que pode estar comprometida tanto pelo envolvimento estético pela obra quanto pela minha amizade pela autora.
Finalizo esta resenha me juntando ao também amigo, jornalista e poeta Marcelo Brettas, que está na “torcida para que não precisemos esperar mais 40 anos pelo próximo livro” de Déborah de Paula Souza, ou somente Dé, como a chamamos.

 

 

 

 

Ficha técnica:
Título: Vermelho Vivo
Autora: Déborah de Paula Souza
Editora: Laranja Original, 140 pgs
Preço: R$ 50

 

 

 

 

 

 

 

Fotos: divulgação


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