De Maurício Mellone em junho 19, 2015
Depois da estreia carioca em janeiro, está em cartaz no SESC Consolação até o final de julho a peça Krum, texto do dramaturgo israelense Hanoch Levin encenado pela primeira vez no Brasil. A montagem é fruto de mais uma parceria entre a atriz Renata Sorrah e a Cia Brasileira de Teatro, que em 2012 já tinham encenado Esta Criança, de Joël Pommerat.
Em 56 anos de vida, o autor, morto em 1999, conviveu com sete guerras. Esta triste experiência ficou, inevitavelmente, marcada em sua obra, principalmente nesta, em que retrata o cotidiano banal e comum das pessoas de uma pequena cidade que convivem com suas sofridas batalhas interiores.
O espetáculo tem início com o personagem central Krum, vivido por Danilo Grangheia, dizendo da plateia:
“Antes é preciso se preparar, armazenar forças, treinar, comer bem, dormir bem, fazer exercícios todas as manhãs…
E vou aparecer enfim novo e disposto. Pronto para recomeçar a viver. Ainda não. Eu vou fazer exercícios todas as manhãs. Só depois. Mais tarde.”
Este mesmo texto finaliza peça, reforçando o tom de toda a trama: apesar de todas as agruras, as pessoas continuam a praticar suas tarefas cotidianas, a lutar com suas questões mais pungentes, suas dores, angústias, frustrações, medos e, principalmente, o desencanto diante da vida. Krum volta para casa depois de ter vivido no estrangeiro, mas volta sem ter aprendido nada, volta tão vazio quanto antes. E lá encontra sua mãe, vivida por Grace Passô em grande atuação, sua antiga namorada Tudra, interpretada por Renata Sorrah, os amigos Tugati (Ranieri Gonzalez) e Dupa (Inez Viana), além do casal Felicia e Dolce (Cris Larin e Edson Rocha) lutando com suas corriqueiras contendas e embates interiores. Há uma sucessão de fatos diante do espectador, com ênfase a dois casamentos e um funeral, mas o desconforto e a desilusão prevalecem.
“O fato de decidirmos montar uma peça de um autor israelense como Hanoch Levin num momento histórico como o nosso, de acirramento do conflito Israel-Palestina e de recrudescimento do pensamento conservador no Brasil é por si só significativo. Se como diz o personagem da peça, ‘para algumas pessoas a palavra impossível não é uma brincadeira’, para nós envolvidos nesta produção o mais importante é sermos realistas, é demandarmos justamente o impossível”, argumenta Patrick Pessoa, componente da Cia.
Saí do espetáculo com a sensação de ter levado um soco no estômago: Krum é um espetáculo árido, constrangedor e depressivo. No entanto provoca uma profunda reflexão de como encarar nosso conturbado, violento e intolerante mundo atual. Elenco coeso, numa produção muito bem cuidada; é sempre uma satisfação assistir Renata Sorrah em cena, uma atriz que se entrega visceralmente a seus personagens.
Fotos: Ricardo Brajterman
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