De em setembro 26, 2011
Após o tradicional terceiro sinal que abre todo o espetáculo teatral, a platéia do
Teatro Ágora é surpreendida com a entrada afobada de um senhor, que desce a escada e pergunta para a senhora se o lugar ao seu lado estava desocupado. Pronto, este é o mote para dar início a Quem Tem Medo de Vera?, montagem de quatro pequenos textos de Vera Karam, dramaturga gaúcha falecida em 2003 que escreveu, entre outras peças, Quem Sabe a Gente Continua Amanhã?, Dona Otília Lamenta Muito e Por que Você não Disse que me Amava.
Numa metalinguagem, o primeiro esquete dessa reunião de textos de Vera Karam gira em torno dos dois espectadores de uma peça que iniciam uma discussão à toa: ele só queria ter certeza se a poltrona vazia ao lado da senhora é a dele. A senhora se levanta e começa uma longa explanação, o que gera irritação e desconforto do senhor. Depois várias tentativas, ele finalmente consegue se sentar e a peça tem início, ou melhor, começa o segundo esquete, em que uma florista recebe em sua loja um provável comprador. Dessa vez, Walter Breda, que assina a direção, optou por deixar a florista e o comprador em níveis diferentes: ela acima com um ramalhete de flores e ele no nível inferior do palco, bem encabulado e sem jeito com seu guarda-chuva. Ele só entrou na loja para fazer hora e começa a se interessar pela bela moça; ambos são tímidos e não conseguem ultrapassar a barreira, não física mas emocional, entre eles. A iluminação e a movimentação dos dois atores enfatizam esse distanciamento entre os personagens.
O terceiro texto é o monólogo de um cobrador de ônibus (vivido por Walter Breda), que é apaixonado por uma passageira mas nunca se declarou. Com riqueza de detalhes e sem nunca terem trocado uma única palavra, o cobrador narra toda a vida de sua musa, desde quando ela era solteira, depois quando começa a usar aliança de noivado e em seguida troca a aliança de mão. A nova etapa da vida dela é a gravidez, depois o nascimento dos gêmeos, a separação, a tristeza e a solidão. O relato segue até o dia em que ele se aposenta e decide voltar para a sua terra.
O último quadro é de três velhinhas que se reúnem para o chá da tarde. Aos poucos o público descobre que aquele encontro fazia parte de um meticuloso programa de reuniões das três irmãs, com pautas estabelecidas, horários e temas: um dia para se falar do pai, outro para comentar sobre os namorados, outro para chorar a perda da mãe. Se alguma delas resolve inverter a ordem da reunião, há brigas e desentendimento. Com ironia, a autora questiona a rotina e a falta de expectativa diante da vida.
Em apenas uma hora, o público tem a chance de conhecer um pouco da dramaturgia de Vera Karam. Quem Tem Medo de Vera? cumpre temporada até final de outubro.
Fotos: Edson Kumazaca
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