De Maurício Mellone em abril 17, 2014
Mesmo tendo sido escrita em 1917 por Luigi Pirandello, a peça Assim é (se lhe parece) é mais atual do que nunca, pois revela uma das características marcantes dos Homens: a mania pela curiosidade da vida do outro, a fofoca e a bisbilhotice. Com direção de Marco Antônio Pâmio, a peça acaba de estrear no SESC Vila Mariana e traz no elenco 12 atores — coisa rara nos dias de hoje!
A trama central gira em torno da chegada de uma família numa província do interior da Sicília, no sul da Itália, após sobreviver a um terremoto. O que provoca a curiosidade da população local é o fato de que eles moram em locais diferentes, o núcleo familiar em uma residência e a sogra em outra. Genro e sogra têm versões opostas para este fato, o que deixa os cidadãos ainda mais curiosos para saber a verdade; eles não se cansam para elucidar o porquê de uma única família não morar sobre o mesmo teto. Cenas de muito humor, recheadas de suspense, prendem a atenção do público desde a primeira cena.
Além de morarem em casas separadas, a senhora Frola, vivida por Bete Dorgam, visita a filha diariamente, mas apenas à distância. Ela diz que em razão da possessividade do genro, Sr. Ponza (Nicolas Trevijano), mãe e filha não podem ter contatos íntimos. Já o genro diz que a sogra tem problemas psiquiátricos, pois não admite que sua filha morreu há anos; por isso ele pede que sua segunda esposa se passe pela filha da Sra. Frola. Estas versões distintas do fato é que aguça a curiosidade dos moradores locais, que promovem um verdadeiro tribunal informal para se chegar à verdade. A enredo original se passa no início do século XX, mas o diretor resolveu transpô-lo para 1940, numa época intermediária entre o tempo original e a atualidade:
“A mudança de época se deu diante da necessidade: manter uma mulher trancafiada, incomunicável nos anos 40 é plausível, mas totalmente irreal para os tempos atuais, da era da comunicação digital em tempo real. Temos assim uma história que nos faz refletir sobre a tal da curiosidade obsessiva sobre a vida alheia, tão característica dos nossos dias, mas não deixamos de lembrar que ela se passa numa outra época”, explica Pâmio.
Mais do que revelar o lado patético das pessoas que param tudo o que estão fazendo para bisbilhotar a vida alheia (o uso das redes sociais hoje virou mania), Assim é (se lhe parece) propõe uma discussão ainda mais profunda, a da impossibilidade de se chegar a uma única verdade. Na peça o personagem de Rubens Caribé, Laudisi, funciona como alterego de Pirandello e questiona a atitude dos cidadãos, indicando as várias possibilidades de entendimento para o mesmo fato:
“Para Pirandello, não existe uma só verdade, mas diferentes pontos de vista. Não existe um só homem, mas diversas máscaras que vestimos no dia-a-dia, desde a hora em que acordamos até a hora em que dormimos. Portanto, não existe uma verdade absoluta”, afirma Caribé.
O que cativa nesta montagem é sem dúvida o texto muito bem articulado, que mescla humor, ironia e suspense (o diretor deixa a revelação da filha da sra. Frola para o final, sempre mantendo a dúvida). A interpretação coesa de todo o elenco é outro grande destaque de Assim é (se lhe parece), que também traz a criatividade de Fabio Namatame, que assina cenário e figurino e uma trilha sonora, assinada por Marco Antônio Pâmio, bem ajustada à trama. O espetáculo fica em cartaz só até a segunda quinzena de maio. Não perca!
Fotos: Heloísa Bortz
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