De Maurício Mellone em janeiro 30, 2018
Considerada uma palavra sem tradução em outras línguas, Saudade é o tema central do documentário de Paulo Caldas, que em pouco mais de 70 minutos traz mais de 40 entrevistas com diversos profissionais do Brasil, Portugal e Angola que procuram definir tanto o termo como o sentimento que ele exprime. São desde escritores (Milton Hatoum, Adriana Falcão), cantores e compositores (Arnaldo Antunes, Bráulio Tavares, Arrigo Barnabé, Mayra Andrade), cineastas (Karim Aïnouz e Ruy Guerra), a historiadores (Durval Muniz), coreógrafos (Deborah Colker), atores (Zé Celso Martinez Correa), poetas, filósofos e comerciantes. Todos falam o que a palavra saudade significa para eles, muitas vezes com sentidos opostos. Há desde a definição ontológica e religiosa de que o Homem foi expulso do Paraíso e espera pela oportunidade de voltar, até a saudade de quem está longe ou a de quem fica, a saudade da perda do ente querido, o sentimento de melancolia associado à palavra, assim como a saudade que impulsiona a agir e criar e a que paralisa e imobiliza.
Com roteiro do diretor em parceria com Giovanni Soares, o documentário segue um formato tradicional (imagens coladas às falas dos entrevistados), mas provoca uma reflexão no espectador na medida em que os depoimentos na maioria das vezes trazem ideias opostas. Se um entrevistado diz que saudade quem sente é aquele que está longe, outro imediatamente depois afirma que saudade é de quem fica e não de quem parte. Como o filme é uma coprodução Brasil, Portugal e Angola e dá ênfase à relação que se estabelece entre a produção artística e a saudade, há depoimentos de artistas dos três países e novamente os diferentes conceitos ficam explícitos. Se para alguns saudade está relacionada à melancolia, dor e inação, para outros ela impulsiona a criatividade, a ação.
O depoimento de uma alemã é emocionante: ela diz que ao conhecer a palavra uma porta se abriu, o mundo se abriu. Se saudade não tem tradução, há algumas possibilidades de definição; o diretor aponta que a palavra inglesa homesick pode ser uma delas, dor de casa ou dor do mundo — a ideia de melancolia aqui é recorrente. E uma questão atual e premente como a dos refugiados também é tocada no filme: muitos refugiados sentem saudade de casa, da sua cidade, mas tudo está destruído e não existe mais! Outro depoimento relevante é o da coreógrafa Deborah Colker: “somos escravos do nosso corpo e o corpo é carregado de saudade”.
Sem dúvida um filme sensível e que faz com que o espectador pense e até reveja seu conceito sobre saudade (ou amplie sua visão sobre o termo e seu significado). Como aperitivo, fique com o vídeo da canção Saudade, de Marina Melo, que fecha o documentário:
Fotos: divulgação
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