De Maurício Mellone em outubro 6, 2016
Depois de temporada carioca, a peça 33 Variações, do venezuelano Moisés Kaufman — inédita no país —, em cartaz no Teatro Nair Bello, marca o reencontro de Nathalia Timberg e Wolf Maya no teatro, ambos com dupla função: ele, depois de 25 anos, volta aos palcos para interpretar Ludwig Van Beethoven, além de assinar a direção; já Nathalia fez a tradução da peça e é a protagonista, vivendo a musicóloga e pesquisadora Katherine Brandt.
A trama acontece simultaneamente em dois momentos históricos: no primeiro, no final do século XX, a pesquisadora norte-americana resolve viajar para a Alemanha para tentar descobrir a razão pela qual Beethoven se debruçou durante quatro anos (de 1819 a 1823) na valsa de Anton Diabelli (André Dias), até então um autor desconhecido, para criar 33 variações da música. Enquanto ela faz suas pesquisas, o público também fica sabendo como o grande compositor do século XIX vivia durante o processo de criação da composição 33 variações em sol maior, opus 120, que passou a ser uma das principais obras de Beethoven.
Contando com a participação ao vivo da pianista Clara Sverner, que executa as composições de Beethoven, a montagem toma todas as dimensões da sala de espetáculo, com o palco dividido: na parte superior a trama se desenrola no passado, com a trajetória do compositor, e na parte inferior, estamos no presente, com as preocupações da musicóloga em conduzir suas pesquisas. O dramaturgo introduz ainda outro elemento para unir a vida da pesquisadora com a de Beethoven: Katherine sofre de esclerose amiotrófica lateral — uma doença degenerativa do sistema nervoso, que acarreta paralisia motora progressiva e irreversível — enquanto o compositor sofria com a crescente surdez. No entanto, o avanço da doença, tanto para Beethoven como para a pesquisadora, não impede que ambos continuem seus trabalhos.
“As histórias das personagens estão ligadas, assim como a luta de ambos para enfrentar doenças que ameaçam seus feitos profissionais. Enquanto a surdez de Beethoven progride, a pesquisadora trava uma batalha contra a esclerose e busca reconstruir laços afetivos com a filha”, esclarece Wolf Maya.
Os cenários e objetos de J.C.Serroni são fundamentais para se contar as duas histórias em épocas distintas: enquanto os aposentos de Beethoven retratam a dificuldade financeira em que ele vivia, os praticáveis que se movimentam e transformam o ambiente da pesquisadora (familiar e profissional) trazem a história mais para o presente. Além dos papéis centrais muito bem defendidos por Nathalia e Wolf, a trama também se vale de personagens secundários que dão sustentação à narrativa; destaque para Gustavo Engracia que dá vida ao ajudante de Beethoven, Lu Grimaldi que interpreta a musicóloga alemã que auxilia Katherine e para o casal vivido por Flávia Pucci (filha da pesquisadora) e Gil Coelho (enfermeiro).
No entanto o grande destaque do espetáculo fica para a atuação das duas veteranas artistas: Clara Sverner, pianista com reconhecimento internacional, tem a chance de mostrar todo seu virtuosismo num espetáculo teatral e não num concerto de música erudita. Já Nathalia Timberg, com seu carisma e talento excepcional, encanta a plateia na pele de uma mulher que mesmo doente, supera suas limitações (há um momento em que a atriz faz um corte e retoma a função de narradora da trama com total domínio e fluidez, enquanto sua personagem já apresentava dificuldade de fala). Emocionante atuação!
Um único senão para a duração do espetáculo: a história poderia ser editada, encurtando as quase duas horas e meia de encenação.
Fotos: Leekyung Kim
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