De Maurício Mellone em dezembro 3, 2012
A premiada Cia mineira Luna Lunera acaba de estrear seu mais novo espetáculo Prazer, no CCBB-SP, e intensifica sua proposta criadora. Assim como já haviam feito com Aqueles Dois, baseado no conto de Caio Fernando Abreu, os atores além de atuarem assinam a direção da peça. Desta vez não quiseram adaptar ou ter como base uma obra, preferiram ter como fonte inspiradora tanto Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres como o universo da escritora Clarice Lispector. Mais precisamente, os atores ficaram impactados com um trecho desta obra:
“Uma das coisas que aprendi é que se deve viver apesar de. Apesar de, se deve comer. Apesar de, se deve amar. Apesar de, se deve morrer. Foi o apesar de que me deu uma angústia que insatisfeita foi a criadora de minha própria vida.”
Com este mote que Cláudio Dias, Isabela Paes, Marcelo Souza e Silva, Odilon Esteves e Zé Walter Albinati conceberam o espetáculo, em que quatro amigos, apesar das inquietações, angústias, perdas e dificuldades cotidianas, tentam a coragem de buscar a alegria.
Ao entrar na sala de espetáculo, o público já encontra os quatro atores em cena, escrevendo frases, pequenos poemas ou mantras que no decorrer da peça fazem parte do drama vivido por cada personagem. Na cena inicial, eles ficam sentados em roda e lembram imagens importantes de suas vidas. Em seguida, com imagens projetadas pelo cenário, eles se movimentam rapidamente e respondem e enviam mensagens eletrônicas entre eles. Como em cada mensagem eles relatam o momento que estão vivendo, o espectador vai montando o perfil destes quatro amigos. Camilo (Cláudio Dias) é o único que está no Brasil, vende seguro de vida e está bem financeiramente, mas sente-se só e infeliz. Isadora (Isabela) é artista plástica e foi para o exterior acompanhando Osório (Odilon), que é médico: eles já se separaram, são bons amigos, mas ela está frustrada profissionalmente e ele, por estar longe de seu país e da família, sente que perdeu a confiança no irmão e em consequência, perdeu a confiança em si mesmo. Marcos (Marcelo) é comissário de bordo e não sabe lidar com a perda, sua mulher o abandonou.
Camilo abandona tudo no Brasil e sai pelo mundo só com uma mochila: eles se reencontram depois de anos e o velho ritual ainda é uma realidade: eles se reúnem regularmente e cozinham juntos. É desta união fraternal que eles buscam forças para superar suas dificuldade cotidianas.
A referência à obra de Clarice Lispector fica evidenciada: apesar da angústia, da insatisfação, da depressão e da perda, juntos eles conseguem se ajudar mutuamente. Se não superam todos os males, é desta fonte de energia vital — a amizade — que se abastecem para se fortalecerem.
Num mundo em que cada vez mais as pessoas se comunicam de maneira impessoal e fria (por meio dos aparelhos eletrônicos) e os vínculos afetivos estão fluidos, Prazer vem como um alento e uma esperança! Em diversos momentos da peça fiquei emocionado pela beleza plástica do espetáculo, mas principalmente pelo congraçamento e união daqueles quatro amigos. Saudade do que já vivi e esperança de poder romper o isolamento e a solidão, tão comuns a nós paulistanos. Que o modo de vida retratado no palco pelos mineiros de BH possa influenciar e motivar as plateias deste nosso imenso Brasil.
Fotos: Adriano Bastos e Carlos Hauck
4 Comentários
Fátima
abril 17, 2013 @ 13:00
Gostei muito e me vi em algumas das situações,os atores são ótimos e o desfecho é contagiante mas não entendi pq Osório usa saia. Muito Sucesso pra vcs.
Maurício Mellone
abril 17, 2013 @ 15:12
Fátima:
Prazer é uma peça que emociona mesmo o espectador.
Que bom q vc gostou; a Cia Luna Lunera estreou a peça em São Paulo,
esteve no Festival de Teatro de Curitiba e agora cumpre temporada
carioca no CCBB. Depois irão para a sede do CCBB de Brasília.
Obrigado pela visita, volte sempre!
abr
Dinah Sales de Olive
dezembro 3, 2012 @ 17:35
Maurício,
Está perfeita sua resenha!
Como já vi o espetáculo, sei que você toca em pontos relevantes e nevrálgicos da peça e faz uma leitura aguçada do ‘Prazer’.
Como sua amiga de anos, compactuo com o que fala sobre a energia vital da amizade – da qual vc me dá provas a toda hora!
Belo texto!
beijo.
Maurício Mellone
dezembro 3, 2012 @ 17:54
Dinah:
Fico contente e emocionado com seu carinho!
Somos mesmo exemplos vivos desta energia vital!
muito obrigado, por tudo!
bjs