De em abril 16, 2012
A montagem de Equus encenada no Teatro Folha não dá trégua aos espectadores. Começando pelo cenário, assinado por André Cortez — um haras estilizado lembrando grades de prisão —, a tensão e os conflitos marcam todo o espetáculo. Já no prólogo, Dr. Maritn Dysart, o psiquiatra interpretado com brilhantismo por Elias Andreato, dá o tom denso e misterioso da trama: o que levaria o adolescente Alan (vivido por Leonardo Miggiorin), de classe média e aparentemente saudável, a cometer crime tão violento e sem justificativas aparentes? Como o garoto que tinha verdadeira fixação por cavalo chegaria a cegar cinco animais? O autor, por meio do método minucioso e criterioso da psiquiatria, vai levantando hipóteses sobre as razões do crime e assim envolve o público do início ao fim.
O que conduz a trama não é a descoberta da autoria do crime, já que o médico é chamado para elucidar o caso depois do ocorrido. A elucidação do ato criminoso é o fio condutor da peça: o médico busca desvendar as condições psíquicas do rapaz para cometer tamanha atrocidade. Para isto, Dr. Dysart inicia uma intensa investigação sobre a vida de Alan, filho de um comunista, funcionário de gráfica (Jorge Emil), e de uma dona de casa muito religiosa (Patrícia Gasppar). As informações técnicas do processo são dadas ao médico pela autoridade judicial (Mara Carvalho), mas o que mais auxilia a investigação são os depoimentos trazidos pelos pais do adolescente. Alan, nas sessões com o psiquiatra, vai de um polo a outro, da introspecção e rebeldia à entrega e confiança plena.
O cativante do texto de Peter Shaffer é que mais do que entender o caso de Alan, durante o processo terapêutico quem mais se recicla e se questiona como pessoa e como profissional é o próprio médico.
O impacto maior fica mesmo para as cenas em que Alan demonstra seu fascínio e atração pelo cavalo: só e na calada da noite é que o garoto, totalmente nu, vai ao estábulo onde trabalha e vive o êxtase ao cavalgar.
Alan é apaixonado, intenso, tem um grau de desequilíbrio tênue. Cuido para não deixá-lo estereotipado ou caricato, mas ao mesmo tempo, ele beira a esquizofrenia, tem uma faísca de loucura, de surto. A relação que ele tem com os cavalos é espiritual. Ele enxerga o sagrado, o divino nesta relação. Ele me exige muita concentração, é preciso muita energia”, confessa o ator.
Além da interpretação visceral de Leonardo Miggiorim, outro destaque de Equus — montada no Brasil em 1976 por Celso Nunes, com Paulo Autran e Ewerton de Castro nos papéis centrais — é a belíssima condução do espetáculo por Elias Andreato. Com a direção precisa de Reinecke, o ator dá o tom exato para o texto envolvente e misterioso de Peter Shaffer. O espetáculo marca a reabertura do Teatro Folha, que passou por uma reforma, e permanece em cartaz até início de julho.
Fotos: Chris Ceneviva
4 Comentários
Denver Wagner
maio 14, 2012 @ 00:55
Adoro o filme do Lumet – o grande problema é ser literal demais e mostrar cavalos de verdade. Todo o poder da peça está, na minha opinião, no caráter elusivo dos cavalos, e como eles são substituídos por corpos masculinos e como isso tudo coloca a questão da masculinidade de Alan sempre em primeiro plano.
Maurício Mellone
maio 14, 2012 @ 11:33
Denver:
A solução do diretor, Alexandre Reinecke, em representar os cavalos
por atores é realmente, como vc bem pontuou, evidenciar o desejo do rapaz
por homens. E a sensualidade das cenas de Alan cavalgando contagia!
abr e obrigado pela visita, volte outras vezes!
Luiz Líbano
abril 24, 2012 @ 14:36
Maurício:
Senti-me impulsionado pela sua resenha em assistir a peça Equus, já que adoro o trabalho dos atores e por ter visto o filme há muitos anos (em VHS) e ter adorado o trabalho do Richard Burton, ex-marido da Elizabeth Taylor. Se a peça corresponder ao filme, é de tirar o fôlego.
Abr
Luiz
Maurício Mellone
abril 24, 2012 @ 14:44
Luiz:
Não me lembro mais do filme (devo ter assistido), mas a peça
retrata com todo o esmero o tratamento psiquiátrico do garoto
fascinado por cavalos, mas que cegou cinco animais. Elias Andreato
vive o médico e Leonardo Miggiorim o adolescente: ambos com composições
de personagens emocionantes. Vá conferir, vc vai gostar muito!
bjs