De em agosto 31, 2011
Há algo mais encantador do que a pessoa, abalada pela perda de um ente querido, transformar essa tristeza em arte? E melhor ainda, num monólogo de extrema comicidade? É exatamente isso que fez a atriz Patrícia Gasppar, há 18 anos: incentivada pela amiga, a atriz Rosi Campos, buscou forças e, da crise existencial porque passava em razão da morte do pai, criou a comédia Futilidades Públicas — em cartaz somente às terças-feiras, no Teatro Folha —, em que uma mulher, presa num banheiro de uma agência bancária que estava sendo assaltada, reflete sobre sua vida, a inusitada situação em que se encontra e questiona as injustiças e ironias da vida. Para Patrícia, uma catarse, e para nós, os espectadores da peça, um deleite e uma comédia que provoca reflexões.
No escuro e somente com o som do que ocorria durante o assalto ao banco é que o público toma conhecimento do drama daquela mulher de meia-idade. Depois de se refugiar no pequeno e sujo banheiro do banco, ela começa seu devaneio. E desde os primeiros gestos e primeiras falas o espectador percebe que está diante de uma comédia rasgada. Do grotesco da situação, ela começa a discorrer sobre o cotidiano, as agruras da vida, as injustiças, sempre com deboche, ironia e cantando suas músicas preferidas. Há momentos em que a personagem faz verdadeiras “viagens”, até parece que está sob o efeito de alguma droga. O público aos poucos embarca na viagem proposta por ela e o riso é envolvente (na sessão em que estava, a atriz precisou esperar os aplausos, em cena aberta, várias vezes).
O texto de Patrícia tem nuances provocativos: em diversos momentos a mulher questiona sobre qual a saída? Mais do que a saída física daquele banheiro inóspito, ela quer uma saída, uma resposta para a sua vida. Elias Andreato, que dirige o espetáculo, define muito bem a proposta da peça:
“O texto de Patrícia é um fragmento de uma mulher de classe média, refém em um pequeno banheiro sujo, onde seu grito por socorro chega até nós como um alerta denunciando a violência e a comédia de se estar vivo nesta cidade, neste mundo tão enlouquecido.”
Em 60 minutos de espetáculo, Patrícia Gasppar tem domínio total da plateia e mostra o que poucos atores conseguem: vai do riso ao drama num átimo, num pestanejar! Com a direção precisa de Andreato, o cenário exíguo e muito adequado do ator Carlos Moreno e com figurino de Fábio Namatame e a iluminação sensível de Wagner Freire (na cena de sexo, luz, vestido e performance da atriz tornam o clima eletrizante), Futilidades Públicas tem tudo para estender a temporada. Nesses 18 anos, Patrícia atualizou a peça e introduziu novidades e canções contemporâneas: há espaço para que o desabafo dessa mulher seja ouvido ainda por muito tempo! E a própria atriz arremata: “Essa comédia é fruto de puro afeto pela vida e pelas pessoas. Só aconteceu e continua acontecendo porque tem gente competente e amiga que gentilmente deu passagem para que meus pequenos delírios criassem raízes.”
Fotos: João Caldas
2 Comentários
Patricia Gasppar
setembro 3, 2011 @ 00:20
Que ótimo, Mellone, muito obrigada por essa resenha. Fico feliz por vc ter entrado na minha “viagem” e ter dado asas a sua imaginação também. Vou dar uma passeada pelo seu blog e desde já te agradeço e desjo boa sorte! bjs, Patrícia.
Maurício Mellone
setembro 6, 2011 @ 14:27
Patrícia:
Fico muito contente por vc ter gostado da resenha! Seu trabalho em cena (e na dramaturgia também)
é maravilhoso e contagiante!
Parabéns e sucesso!
Bjs